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O que ocorre quando as filhas começam a ofuscar suas mães?

Nossa obsessão por juventude é causada em parte pelo anseio das meninas se identificarem como adultas e a infantilização das mulheres na idade adulta

Por Audrey D. Brashich
Atualização:
A atrizReese Witherspoon com sua filha Ava Elizabeth Phillippe e seu filho Deacon Reese Phillippe Foto: Reuters

Todos já ouvimos proclamações como estas: hoje 40 anos equivale a 20. Cinquenta equivale a 30. Maturidade agora significa uma nova adolescência. Resultado? A noção do envelhecimento mudou e as mulheres mantêm a aparência juvenil por mais tempo do que outrora. 

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Celebridades como Elle MacPherson (51 anos), Bethenny Frankel (45) e Christie Brinkley (61) - e outras mulheres não tão célebres que seguem o mesmo caminho delas - demonstram diariamente ser possível aparentar 35 anos para sempre. É o resultado dos avanços no campo da cirurgia plástica e estética médica, e assim o comentário "vocês parecem irmãs" está se tornando um fato real tanto quanto os elogios para muitas mães e filhas atualmente.

Basta olhar para Reese Witherspoon e sua filha Ava, Julianne Moore e sua filha Liv Freundlich, ou a cantora Vanessa Paradis e Lily Rose Depp. 

Tanto no caso das mães como das filhas, envelhecer em meio a atual cultura da beleza é particularmente difícil. Isto porque hoje, as mulheres crescem juntamente com ideais e expectativas de beleza que têm se intensificam cada vez mais. "As exigências hoje são maiores do que nunca no que se refere a padrões de beleza", diz Jennifer Berger, diretor executivo de About-Face, organização sem fins lucrativos em San Francisco cuja finalidade é oferecer para mulheres e jovens ferramentas para resistirem às mensagens de mídia nocivas. "Nossa cultura valoriza a juventude feminina a tal ponto que mães de 45 anos acham que têm de aparentar 20 para se manter em dia ou não se sentir colocadas de lado. E infelizmente aparentar ser mais jovem significa cuidar mais do que nunca do rosto, do corpo, da pele".

Hoje o que vem registrando um enorme boom são as extensões de cílios e a correção de sobrancelhas. "Mães chegam aqui o tempo todo dizendo que querem cílios e sobrancelhas mais abundantes como suas filhas", diz Rickina Velte, esteticista em Virginia Beach. "Elas acham que precisam ser bonitas por mais tempo e suas filhas jovens deixam isto extremamente óbvio".

Nossa obsessão por juventude é causada em parte pelo anseio das meninas se identificarem como adultas e a infantilização das mulheres na idade adulta. É o que se chama nos Estados Unidos de "Age Compression". É a razão pela qual as mesmas celebridades aparecem em revistas direcionadas para mulheres e naquelas cujo público alvo são adolescentes - e também porque a moda nas lojas para mulheres com frequência se parece muito com o que vemos nas butiques de moda para adolescentes.

Resultado - uma competição de beleza entre as mulheres em estágios amplamente diferentes das suas vidas. "Aqui estamos lidando com mães que vivenciam a perda inevitável da juventude e suas filhas que se tornam sexualmente maduras e portanto mais atraentes para o sexo oposto", diz Lori Gottlieb, terapeuta familiar e autor do livro sobre transtorno alimentar chamado Stick Figure: A Diary of My Former Self.

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A apresentadora Xuxa e sua filha Sasha Foto: Luiz C. Ribeiro/BrazilFoundation

"É um fenômeno envolvendo um conjunto de transições - o outono e a primavera da condição feminina". 

Portanto, não surpreende o fato de algumas mulheres depararem com este momento difícil apesar de se sentirem orgulhosas e felizes com relação às suas filhas. Afinal, atravessamos um momento na nossa cultura em que as mulheres que durante toda a sua vida foram encorajadas a investir na sua aparência e que foram recompensadas com uma aparência jovem estão envelhecendo. E no caso de muitas mães, isto ocorre exatamente quando suas filhas entram numa fase nas suas próprias vidas que está associada a uma beleza sem necessidade de nenhum esforço. Mesmo supermodelos estão enfrentando o problema. "Gostaria de dizer que foi fácil para mim envelhecer", confessou Cindy Crawford em seu novo manual de estilo de vida Becoming. "Sempre brinquei com minha filha - que todo mundo diz é minha miniatura - dizendo : 'você tem o mesmo cabelo que eu tinha antigamente. Quero-o de volta. Ou então 'você tem as pernas que eu tinha outrora. Quero-as de volta'".

E ela não é a única. Para Joyl Dill, de 46 anos, de Denver, que trabalhou como modelo no Japão ainda adolescente até os seus vinte anos, ver sua filha de 14 anos crescendo com tanta beleza suscita muitas sensações conflitantes. "Quando era jovem dava um enorme valor à minha aparência", afirma Dill que reconhece também que atualmente "sente a dor do envelhecimento" em nossa cultura. "Adoro olhar minha filha desabrochar e se transformar daquela menina levada em uma jovem graciosa, mas é estranho ver homens da minha idade olhando extasiados para ela". O que eles fazem naturalmente porque nossa cultura não tem problemas com casamentos como os de Michael Douglas e Catherine Zeta-Jones (diferença de idade: 25 anos) ou Billy Joel e Alexis Roderick (diferença de idade: 33 anos).

Christina Daves, com quase 50 anos, que vive em Washington D.C., concorda: "lembro os dias em que meu marido e eu dávamos muitas festas e eu sempre era "a bela do baile". Hoje, porém, é a minha filha e suas amigas que despertam a maior atenção. "Tenho muito orgulho da sua beleza e confiança, mas é duro saber que todos os homens estão olhando para elas e não para mim".

Assim, como as mães de filhas podem aceitar envelhecer na nossa atual cultura da beleza enquanto olham suas filhas desabrocharem? 

Segundo Lori Gottlieb, as mães começam a entender a sexualidade emergente das filhas. "É uma fase saudável pela qual todas as meninas passam", diz Gottlieb, "e é importante não ser estraga-prazeres. 

Fazer com que elas não se sintam bem com as novas descobertas ou ignorar isto por causa dos seus sentimentos ambíguos a respeito é uma maneira de enviar uma mensagem confusa e afeta a autoconfiança delas".

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E por mais difícil que seja, as mães também precisam ignorar a pressão cultural para agir e parecer mais jovens que suas filhas. Porque nessa luta não há vencedor. "Mesmo as celebridades ou as muito privilegiadas que podem investir em procedimentos que ajudam a manter uma aparência juvenil não irá manter isto para sempre", afirma Jean Kilbourne, autora do livro "So Sexy So Soon: The New Sexualized Childhood".

E não existe nada pior do que tentar e fracassar. Lembra-se como a atriz Kim Novak foi ridicularizada quando apareceu numa entrega de prêmios da academia em 2014? Foi escarnecida e ridicularizada pela imprensa porque sua óbvia cirurgia plástica era primitiva e patética. 

No final, a maneira como as mães lidam com o envelhecimento é que prepara o terreno para a relação das suas filhas tanto com a cultura da beleza como com sua própria imagem.

"Temos de pensar que tipo de mulher gostaríamos de educar", afirma Dina Zeckhausen, fundadora da Eating Disorders Information Network, de Atlanta. "Porque se não mudarmos completamente o que hoje é cultuado tanto para mães como para filhas, nossos valores culturais em torno deste tema não mudarão também".

Audrey D. Brashich é autora de "All Made Up: A Girls Guide to Seeing Through Celebrity Hype and Celebrating Real Beauty

Tradução de Terezinha Martino

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