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Cuba em versão pop e fashion

Chanel explora temas da cultura cubana em uma coleção colorida

Por Maria Rita Alonso
Atualização:
A cidade parou para ver a tropa de Karl Lagerfeld, diretor criativo da maison, passar Foto: REUTERS/Alexandre Meneghini

Foi curioso ver como Karl Lagerfeld se apropriou dos símbolos cubanos para dar uma roupagem mais casual, atual e pop à coleção Cruise da Chanel, desfilada na terça-feira, 3, em Havana. Os lendários Buick, Oldsmobile e Cadillac, que circulam majestosamente pelas ruas de Havana, viraram motes de estampas, enquanto os tons esmaecidos das casas dos anos 1940 e 1950 tingiram vestidos curtos e glamourosos de festa. A guayabera, tradicional camisa com quatro bolsos, abas nos ombros e pregas planas, ganhou versão chique e sensual confeccionada em organza (não em linho nem em algodão, como de costume). Um pelotão de modelos usando conjuntos verde-musgo ou jaquetas caqui lembrou os uniformes militares da revolução. A mistura de Coco Chanel com ícones da cultura da ilha de Fidel foi, de fato, sui generis. Mas, em termos fashion, funcionou perfeitamente bem.

O desfile, armado em pleno Paseo del Prado, parou a cidade, na última terça-feira. A modelo Stella Tennant, dona de uma beleza andrógina, foi a primeira a aparecer, com camisa, um longo casaco sobre calças largas e sapatos bicolores, que são um clássico da boêmia do início do século 20. O chapéu Panamá, feito pela Maison Michel, finalizava esse e outros looks. O início do show foi marcado por silhuetas bem características dessa coleção, que mistura elementos do guarda-roupa masculino com o do feminino (outro emblema do estilo Chanel).

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Dizeres como ‘Viva Coco, Cuba Libre’ estampavam uma camiseta divertida, usada com tailleur multicolorido de tweed, cortado em modelagem comportada, típica da grife. Enquanto uma boininha luxuosa preta de paetê dava um charme meio francês chique, meio jovem rebelde à roupa. 

Em uma bolsa-mochila, o logo Coco Club fazia referência à marca de rum Havana Club, uma das mais famosas do país. A vegetação tropical e exuberante que marca o balneário latino veio em bordados refinados, com grandes folhas de Monstera presas entre camadas de tule. O auge do clima cubano foi a entrada de modelos fumando charutos na passarela.

No casting, a jovem brasileira Chris Hermann chamava a atenção desfilando com altivez e delicadeza (olho nela!). Enquanto isso, Gisele Bündchen, que se aposentou recentemente das passarelas, assistia a tudo da primeira fila, improvisada nos bancos do Paseo, com um sugestivo vestido vermelho e uma boininha bordada (igual as que foram desfiladas). As atrizes Tilda Swinton e Vanessa Paradis também estavam na plateia, assim como o neto de Fidel Castro, o modelo Tony Castro, e o ator Vin Diesel, que passa uma temporada na cidade para as filmagens de "Velozes e Furiosos, parte 8". Ele, um outsider do universo da moda, foi, por sinal, um dos mais festejados pelos moradores. Nas varandas dos casarões, as pessoas gritavam e acenavam calorosamente para os convidados que chegavam a bordo dos carros vintage (uma frota com 170 veículos antigos fez o transporte dos 600 convidados da marca para o show).

A paleta de cores da coleção veio, justamente, inspirada nas fachadas barrocas e vibrantes da cidade velha, onde se localiza parte do Paseo del Prado. Amarelo, rosa, laranja e turquesa emprestaram o charme latino à coleção. No final do desfile, uma sequência alegre de vestidos curtos, de paetês ou bordados, encerrou o show. Alguns deles eram tomara que caia e outros tinham mangas bufantes.  A festa continuou na Praça da Catedral de Havana, na Cidade Velha, coração barroco e boêmio da cidade, na frente de San Cristobal, uma das mais lindas igrejas do século 18, na América Latina. O lugar foi decorado com peças e mobiliários de artesãos locais. Karl Lagerfeld chegou a arriscar uns passinhos na pista de dança, animada pelos músicos Septeto Habanero, Ibeyi, Rumberos de Cuba e o DJ Hugo Mendez. 

Enquanto isso, nas ruas de Havana... Meia-calça preta, toda decorada com flores ou estampas geométricas, é a última moda em Cuba, mesmo sob calor de 30 graus. Jeans justo, tênis esportivos e nail arte (unhas decoradas) também são bem populares entre as mulheres locais, que já começam a conhecer e a almejar marcas internacionais.

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Depois de quase 60 anos renegando ícones e marcas ocidentais, e o estilo de vida ligado ao consumo, a chegada da elite da moda francesa à ilha, depois do papa, de Obama e dos Stones, foi, sim, um momento histórico. Os desfiles denominados Cruise ocorrem entre as semanas de moda de Paris e trazem as coleções de veraneio. A Chanel apresentou suas últimas coleções Cruise no Oriente, o último foi em Seul, na Coreia do Sul, e o penúltimo em Dubai, nos Emirados Árabes. No caso de Cuba, é totalmente diferente. O país serviu apenas de inspiração e cenário, já que a marca não tem lojas lá. Foi também o primeiro palco da América Latina para um desfile da marca, que agora volta a dar atenção especial para o lado de cá do planeta.

Karl Lagerfeld em retrospectiva. Cuba foi alçada ao centro da moda com a apresentação da coleção Cruise da Chanel e com a abertura da exposição "Obra en Proceso/Work in Progress", que traz quase 300 imagens feitas pelo diretor criativo da marca, o estilista Karl Lagerfeld. O evento, na galeria de arte Factoría Habana, no centro tombado da capital, contou com a presença do estilista, de 83 anos. Está dividida em três seções e exibe as perspectivas estéticas do kaiser, que também atua como fotógrafo de moda desde os anos 1980. “A riqueza cultural e a abertura de Cuba ao mundo a tornaram uma fonte de inspiração para Karl Lagerfeld”, ressaltou a grife em um comunicado. A mostra faz parte da programação do Mês da Cultura Francesa em Cuba e fica em cartaz até 12 de maio.

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