Como agir menos estupidamente, segundo os psicólogos

'A interação de diferenças individuais e fatores ambientais pode servir como previsão da propensão de certas pessoas mostrarem um comportamento que outros chamariam de estúpido'

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Por Roberto A. Ferdman
Atualização:
Definir algo que alguém fez como estúpido não implica que aquela pessoa não seja inteligente Foto: Patrick Giblin/ Creative Commons

Todos os dias, as pessoas em geral presenciam inúmeros comportamentos esquisitos. Uma roupa bizarra ou uma conversa estranha, um gesto nada familiar ou algo que, realmente, não se enquadra no conceito de comportamento aceitável.

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Um dos casos mais comuns, neste sentido, uma das coisas que tende a representar um rompimento mais do que qualquer outra, é algo - ou são algumas coisas - que gostamos de definir como estúpidas.

Aquilo que aconteceu. Aquilo que a pessoa fez. Foi algo tão "estúpido".

Esta palavra é usada de maneira tão indiscriminada, e no entanto raramente - ou mesmo nunca - paramos para pensar o que entendemos por ela. Quando muito, temos uma ideia do que não significa: definir algo que alguém fez como estúpido não implica que aquela pessoa não seja inteligente. Afinal, muitas pessoas dotada de QIs elevados conseguem fazer coisas que consideramos "estúpidas".

Mas isto não responde à indagação do que "estúpido" possa significar, ou o que queremos dizer com a maneira como usamos o termo. Não descer na estação certa quando viajamos de trem, ou tropeçar num objeto parado porque estávamos mergulhados na leitura de um livro - chamamos a isto estúpido, mas seguramente é algo mais, algo mais preciso.

Intrigado, Balazs Aczel, professor do Instituto de Psicologia da Universidade Eotvos Lorand, de Budapeste, quis saber mais a respeito. Segundo explicou, interessou-se pelo mundo bizarro do comportamento não inteligente, por ser surpreendentemente inexplorado. Com Bence Palfi e Zoltan Kekecs, dois outros pesquisadores na área de psicologia da mesma universidade, decidiu realizar um estudo e para tanto reuniu uma amostra de histórias - ao todo 180 - de sites de notícias, blogs, fóruns e outra literatura disponível na mídia, nos quais era descrita uma ação que poderia ser caracterizada como estúpida. As histórias então foram apresentadas a mais de 150 pessoas, que tiveram de preencher um questionário.

Para cada história, elas respondiam a uma variedade de perguntas, como por exemplo: "Você definiria esta ação específica como estúpida?" e, se a resposta fosse sim: "Numa escala de um a dez, que nota você daria em termos de estupidez?". Além disso, os participantes deviam explicar por que achavam determinada ação estúpida, escolhendo uma entre várias categorias.

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O que os pesquisadores constataram foi que as pessoas tendem a concordar com o que merece ser chamado de estúpido e com o que não merece - houve cerca de 90% de concordância. Eles descobriram que aparentemente há três situações em que tendemos a usar a palavra estúpido. Três cenários, caracterizados por tipos específicos de comportamento, que fazem com que as pessoas façam uma careta, riam, ou coloquem a mão na testa.

Você não viu que aquilo estava se aproximando? A primeira é o que Aczel e sua equipe chamam de "ignorância confiante". É quando a capacidade de uma pessoa de fazer alguma coisa, de acordo com sua percepção, ultrapassa consideravelmente sua capacidade real de fazê-la, e está associada ao nível mais elevado de estupidez.

Imagine um motorista bêbado, que se julga perfeitamente capaz de controlar a direção. Ou um ladrão, que, pretendendo roubar um telefone, pega um aparelho de GPS, e é pego imediatamente pela polícia.

As pessoas não só acham este tipo de comportamento estúpido, como o associam ao mais elevado grau de estupidez. Estas ações receberam uma nota média de estupidez de 8,5, de um a 10, muito maior do que a nota dada a outra ação qualquer. 

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"A coisa mais estúpida que alguém possa fazer é superestimar-se", ele disse. "O que indica que uma pessoa não precisa ter um QI baixo, na opinião geral, para agir de maneira estúpida. Só precisa ter uma percepção equivocada de suas habilidades".

Ele não conseguiu deixar de fazer aquilo. A segunda coisa que definimos como estúpida é quando alguém faz alguma coisa porque, em determinado momento, perdeu a capacidade de agir de outro modo.

Aczel chama a isto "falta de controle" e a caracteriza como o resultado de um "comportamento obsessivo, compulsivo ou que indica dependência". E dá o exemplo de uma pessoa que decide cancelar os planos feitos com um bom amigo a fim de continuar jogando videogame em casa.

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Que cara alienado! O terceiro tipo de comportamento que as pessoas gostam de chamar estúpido é o que Aczel define como "desatenção - falta de senso prático". É um cenário em que o indivíduo faz alguma coisa claramente irracional, mas por uma razão que poderia ser uma de duas coisas: ou não prestou atenção ou simplesmente não estava absorto em outra coisa.

Por exemplo, uma pessoa que, depois de encher excessivamente os pneus do carro, acaba parado no acostamento por causa de um pneu estourado. Ou ela esqueceu de prestar atenção enquanto enchia os pneus ou não sabia que deveria prestar atenção. Chamamos a ambos os cenários de estúpidos, embora menos estúpidos do que os exemplos anteriores.

Estúpido é como estúpido faz? De certo modo, a pesquisa de Aczel lembra a famosa cena citada frequentemente do filme Forrest Gump, em que Tom Hanks, quando alguém pergunta se ele é louco ou apenas estúpido, responde: "Estúpido é como o estúpido faz".

Esta pesquisa oferece importantes lições para todos nós, porque o que optamos por chamar estúpido, na realidade tem um efeito significativo no nosso comportamento. Como Aczel e seus colegas escrevem em seu trabalho:

"Estas categorias de estupidez podem prever quais são os contextos ambientais ou estados interiores que aumentam a probabilidade de uma pessoa se comportar de uma maneira que os outros chamariam estúpida. Por exemplo, alguma substância ingerida ou apoio social excessivo podem promover uma confiança desproporcional em relação à competência. Comportar-se da maneira habitual ou realizar múltiplas tarefas ao mesmo tempo pode provocar falta de atenção. Estados afetivos intensos podem resultar no fracasso do controle comportamental. Nossas conclusões sugeririam que estes contextos ambientais ou interiores fazem com que sejamos mais propensos a cometer bobagens. A interação de diferenças individuais e fatores ambientais podem servir como previsão da propensão de certas pessoas mostrarem um comportamento que outros chamariam de estúpido."

As lições podem ser particularmente relevantes para pessoas que se consideram muito inteligentes. Vejamos o trabalho de Daniel Kahneman, Prêmio Nobel e professor de Psicologia da Princeton University, no qual, usando questões aritméticas, ele concluiu que a inteligência pode fazer com que seja mais difícil encontrar respostas simples.

Ele não imaginou o motivo pelo qual isto acontece, mas levantou a hipótese de que pessoas inteligentes poderiam ser menos capazes de se avaliar, tornando-se assim mais vulneráveis. Quando precisa resolver um problema de matemática, por exemplo, o indivíduo inteligente talvez suponha que não cometerá os mesmos erros de pensamento dos seus pares, o que na realidade o torna mais propenso a cometê-los.

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Esta hipótese - achar que você está acima do erro, quando na realidade não está - encaixa-se muito bem nas formas mais flagrantes de estupidez que Aczel conseguiu identificar: a categoria da "ignorância confiante".

Também parece apontar para um útil lembrete.

Agir de uma maneira que não é considerada estúpida é uma meta compartilhada pelos indivíduos mais razoáveis, mas muitos deles provavelmente menosprezam um atributo fundamental que lhes permitiria atingi-la melhor: a modéstia.

"Se você não quiser fazer algo estúpido, provavelmente não quer ter expectativas maiores de suas capacidades do que deveria ter", disse Aczel. "A coisa pior que alguém pode fazer é agir com muita confiança, e seriamente, e no entanto não agir de maneira razoável. Isto é o máximo da estupidez".

Tradução de Anna Capovilla  

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