O plano B que deu certo

Karina Sterenbergh, Amir Slama e Sarah Chofakian contam por que deixaram suas carreiras pela moda

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Por Mariana Abreu Sodré e Maria Christina Hansen
Atualização:

Há dez anos, Karina Sterenbergh, de 34 anos, era gerente de direitos autorais da gravadora Warner. Tinha carro bacana, décimo terceiro e décimo quarto salários, se divertia com ligações nonsenses de Tim Maia e Roberto de Carvalho, e com muitas viagens pelo Brasil e exterior. Aos 24 anos, viajava com freqüência para Los Angeles, com a missão de visitar a sede da multinacional. Na capital do glamour americano, circulava a bordo de limusine, como se a vida fosse um vídeo clipe. Sete anos se passaram para alcançar tal posição, que também incluía muita, mas muita burocracia e trabalho duro. A carreira de Karina começou cedo, aos 17 anos, e logo ela era a mais bem-sucedida da turma. "Vivia uma realidade completamente diferente das que minhas amigas viviam. Trabalhava com música'', descreve ela, sem precisar explicar muito mais. O trabalho meio que a obrigou a deixar a faculdade em segundo plano. Mas, com esforço e muito jeitinho, Karina se tornou bacharel em Direito após seis anos de - vá lá - estudos. A verdade é que, desde o primeiro semestre de aulas, sabia que aquela não era a sua praia. Tanto que foi procurar estágio com uma vizinha que trabalhava na Universal Music, ao invés de enviar o currículo para um escritório de advocacia. "Eu me formei porque tenho um compromisso comigo de terminar tudo aquilo que começo", diz a estilista. Ah, sim, Karina é estilista. E proprietária da bem-sucedida marca Ka, que soma cinco anos de mercado e se prepara para aportar em novo endereço, no shopping Fórum de Ipanema. É que dez anos atrás, Karina trocou a rotina que parecia perfeita aos olhos dos outros por um novo capítulo na sua vida: a moda. O mesmo caminho foi trilhado por Amir Slama e Sarah Chofakian. Para iniciar esse novo "ciclo", a ex- executiva se matriculou numa faculdade de moda, ramo que sempre amou. "Recomecei do zero, fui fazer estágio, mas sempre com o objetivo de ter o meu negócio. Trabalhei com Alexandre Mattos, numa fábrica, e fiz carreira na Animale. Quando estava segura, abri a Ka. Vendi a minha Pagero Sport, que comprei com o dinheiro do meu trabalho na gravadora, para adquirir meu primeiro ponto de venda. O principal desafio? Foi trocar a segurança de uma multinacional por um mercado pouco profissionalizado como o da moda. Mas é o que amo e no que acredito", resume. "Não paro para pensar o que teria acontecido caso não tivesse tido a coragem de mudar. O mercado fonográfico hoje é outro, sou outra também. Então, não dá para avaliar", comenta Karina. "O Andre Midani, profissional da música, tem uma frase ótima: a vida é mais generosa com quem se movimenta", destaca. "E é isso. Não adianta sustentar uma situação que não está bacana por medo. Depois que você toma atitudes, se movimenta, a vida parece, realmente, olhar de uma outra maneira para você", filosofa Karina. "O mercado de moda é difícil. Mas o que é fácil nesta vida? Na moda, você depende de uma cadeia de prestadores de serviço, da bordadeira que some, do tecido que fica preso na alfândega, mas tem que se virar. Nunca me iludi, sempre quis ter minha marca e sabia que o criar era apenas 5 % do processo. Ser dona de uma empresa também é bem diferente de ser empregada. Há o tal fluxo de caixa, enquanto não existe o cheque no final do mês. Contudo, valeu a pena e muito", finaliza, feliz. GANHA-PÃO Se Karina mudou de área em busca de satisfação e deu as costas para o luxo, o historiador Amir Slama encontrou na moda uma opção para pagar as contas no final do mês, e acabou descobrindo na carreira de estilista e empresário de moda grandes semelhanças com o que sempre almejou profissionalmente. "O que queria mesmo era trabalhar com pesquisa. Viajar pelo mundo participando da vida das pessoas era o meu objetivo na época em que era estudante e trabalhava como barman em bares como Café Piu Piu. Mas logo vi que pesquisa não dava dinheiro e, como alternativa, depois de formado, comecei a lecionar História na PUC-SP. Com o passar do tempo, percebi que dar aula me frustrava um pouco, pois não gostava de ficar preso na sala de aula", conta Amir Slama. Mas as contas continuavam a chegar, e o historiador, então, teve vontade de mudar de ramo. Os pais estavam envolvidos com o mercado de confecções e, a partir daí, Amir Slama fez a transição da sala de aula para o mundo da moda. Começou a confeccionar biquínis com três máquinas de costura, presentes do pai, em um espaço que nem sequer tinha telefone. "Demoramos um ano e meio para conseguir comprar uma linha", lembra o estilista. "Descobri, então, que a distância entre a História e a Moda não é tão grande. A moda é uma forma de se comunicar com o mundo e de transformá-lo. Hoje mantenho o mesmo objetivo de antes, que é atingir as pessoas por meio de pesquisas", explica ele, com muito conhecimento de causa. Basta mensurar o poder da Rosa Chá para entender o recado. "Por meio de pesquisas e intuição, consegui identificar um novo nicho para a moda praia que antes era exclusiva do Rio de Janeiro. A partir da criação da Rosa Chá, conseguimos mostrar que São Paulo também tem a sensualidade brasileira", comenta. "No entanto, a falta de tempo para pesquisar e escrever é o lado negativo desta troca de carreira", conclui Amir Slama, que hoje se ocupa em incrementar a linha masculina de sua marca, em plena ascendência. SONHO ANTIGO Orgulho é o sentimento da psicóloga Sarah Chofakian, depois de ter preterido a psicologia pelo design de sapatos. Mas demorou a chegar. Sarah escolheu a primeira carreira aos 17 anos. Quando se formou, aos 22, já havia feito estágio e estava montando seu consultório. Tudo parecia correr bem: os pacientes começavam a aparecer e os pais de Sarah, que sempre quiseram que ela seguisse uma carreira mais "intelectual", estavam felizes da vida. Porém, um ano depois, por conta de sua separação, ela resolveu fazer uma viagem de 40 dias pela Europa. "A faculdade e o consultório aconteceram muito rapidamente. Não tive tempo de pensar se tudo aquilo estava me fazendo feliz. Durante a viagem, pude realmente olhar minha vida e percebi que não estava realizada." De volta ao País, Sarah tomou fôlego para concretizar o antigo sonho de ter uma marca de sapatos. O comércio estava no DNA da família: seus avós, refugiados da Armênia, eram comerciantes e tinham uma loja no interior de São Paulo. O stand onde vendiam sapatos era o local favorito de Sarah desde menina, e foi lá que ela aprendeu suas primeiras lições sobre calçados. Apesar dos protestos de toda a família, a psicóloga foi em frente e correu atrás de cursos e informações na área. "Só me apoiaram depois que comecei a ir bem", conta a estilista e empresária. Contudo, a tal consagração familiar só veio mesmo quando o avô de Sarah lhe disse que estava orgulhoso de ter o sobrenome da família nos jornais. Era a continuidade da história e da tradição dos Chofakian. Com base em sua trajetória, e em tempos de vestibular, Sarah deixa uma mensagem para os que estão no processo de escolher uma faculdade. "Faça algo que o deixe realmente feliz e que você, obviamente, saiba fazer bem. Sempre fui elogiada pela minha segunda escolha, deveria saber que o meu caminho era por aí."

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