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O mercado para o capital humano

Por Daniel A. Epstein
Atualização:

Com o aperto nos orçamentos provocado pelo declínio econômico, o ensino superior torna-se inacessível para um número maior de famílias. Para muitos, cada vez mais o sonho americano parece ser apenas um sonho. Mas já que estamos sonhando, imagine um jovem de Montana que, depois de obter um bom resultado no vestibular americano, encontra investidores ansiosos para financiar sua formação. Imagine a General Motors investindo nas escolas de Detroit como estratégia de sobrevivência no longo prazo. Imagine os maiores investidores e corporações, depois de anos priorizando a responsabilidade fiduciária em detrimento da responsabilidade social, descobrindo subitamente que ambas estão indissociavelmente relacionadas. Imagine todos nós descobrindo que não basta estar envolvido nas apostas e riscos da sociedade; precisamos ser acionistas desta sociedade. Parece otimismo demais, mas poderíamos transformar esta visão numa realidade por meio da criação de um mercado para o capital humano. Tudo começa com um número: 17. Um crescimento anual composto de 17%, para ser mais exato. É este o astronômico potencial de crescimento da intervenção educacional nas crianças pequenas, de acordo com James Heckman, economista premiado com o Nobel. O retorno se manifesta no aumento da renda futura e na redução dos custos sociais. Hoje, este crescimento anual composto não é acessível aos investidores, mas se as pessoas pudessem emitir ações sobre a sua renda futura, desencadearia tal potencial, dando início a um imenso fluxo de investimento nas crianças. Imagine uma situação que é, infelizmente, bastante comum. Uma mãe mantém dois empregos e todas as manhãs deixa a filha na casa de uma amiga buscando-a de noite. A mãe não pode pagar uma creche de qualidade e, por causa disso, estatísticas mostram que esta criança, daqui a alguns anos, será mais propensa a repetir de ano, engravidar na adolescência, cometer crimes, frequentar a emergência hospitalar ou depender do sistema de seguridade social. Um dia a renda desta criança será menor do que a de pessoas com históricos parecidos que frequentaram creches. Mas como seria se esta criança pequena tivesse algo a oferecer aos investidores? Se ela pudesse vender uma porcentagem da sua renda futura em troca de um cupom para frequentar a creche, e se o governo oferecesse crédito fiscal a investidores para compensá-los pelo custo social cada vez menor com o qual o sistema teria de arcar, investidores poderiam concorrer para pagar pela sua educação. Milhões de crianças obteriam acesso ao financiamento para atingirem seu potencial completo, o governo economizaria muito e os investidores receberiam lucro considerável. Além disso, um sistema como este teria efeitos colaterais revolucionários. Assim como o mercado de ações permitiu que a mão invisível guiasse os fundos às ações com potencial de crescimento mais promissor, o mercado de capital humano poderia levar os fundos às pessoas com o maior potencial de aumentar a própria renda e reduzir seu custo social. É neste aspecto que ele transformaria a sociedade, porque a pesquisa de Heckman mostra que o crescimento anual composto de 17% se restringe aos mais pobres. Basta pensar na lei dos rendimentos decrescentes: o investimento terá maior impacto sobre aqueles que tiverem mais a ganhar. Acrescente a isso o fato de as crianças das famílias ricas não enfrentarem a necessidade de emitir ações, e chegamos a uma solução para o desenvolvimento deficiente do capital humano; uma solução para a desigualdade educacional. Mas o mercado não ajudaria simplesmente os pobres e os seus investidores. Mercados são fábricas de informação. Eles agregam imensas quantidades de dados para criar uma imagem coerente do valor dos investimentos. Em troca de ações, os investidores poderiam oferecer cupons que seriam trocados por serviços capazes de agregar valor, como a educação na primeira infância, nutrição adequada, currículos específicos, material escolar ou treinamento vocacional. Assim como o preço dos títulos no mercado de ações nos ensina com o tempo quais são as práticas mais eficazes na economia, os preços das ações no mercado de capital humano nos ensinariam quais práticas seriam mais eficazes para o desenvolvimento do capital humano - aquilo que funciona melhor na educação (um assunto muito discutido). E esse aprendizado ajudaria a todos. É claro que as desafiadores questões logísticas e morais envolvidas teriam de ser respondidas. Mas antes de descartarmos essa proposta por força dos obstáculos logísticos ou morais, devemos também considerar o sofrimento de milhões de americanos que seriam submetidos à desigualdade e à injustiça como decorrência da nossa inação. *É analista da Knowledge Learning Corp., rede nacional de ensino para a primeira infância, e defensor de políticas federais e estaduais para a educação durante a primeira infância

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