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Na França, papa defende influência da fé na política

Em discurso para intelectuais, pontífice lamenta a hegemonia da ciência e reivindica a participação da Igreja nas deliberações de Estado

Por Andrei Netto
Atualização:

Em sua primeira visita à França desde o início de seu pontificado, há cerca de três anos e meio, o papa Bento XVI pediu ontem um lugar para a Igreja nas decisões de Estado. A reivindicação foi feita no Palácio do Eliseu e aplaudida pelo presidente francês, Nicolas Sarkozy, que por sua vez pregou uma nova relação entre o Estado e a Igreja - que denomina "laicidade positiva". Sarkozy declarou que "se privar das religiões seria uma loucura" e convidou-as ao diálogo em temas como genética. Para tanto, impôs uma condição: o respeito à tradição judaico-cristã da Europa. "Não nos consideramos melhores do que ninguém, mas assumimos nossas raízes cristãs." Em seu discurso, falado em francês fluente, Bento XVI lamentou a hegemonia da ciência sobre a religião, destacou seu papel insubstituível para formar as consciências e pediu um lugar para a fé nas decisões públicas, reafirmando "a contribuição que ela pode dar à criação de um consenso ético fundamental na sociedade". Horas depois, em discurso no Colégio dos Bernardinos para 700 intelectuais, entre escritores, jornalistas, filósofos, artistas e políticos convidados, o papa reconheceu que "para muitos, Deus é um grande desconhecido". A seguir, criticou a "cultura puramente positivista" além de alertar contra o "fanatismo fundamentalista". UNIÃO GAY E ABORTO Referências feitas ao longo do dia ao Estado e à ciência foram interpretadas na França como uma tentativa do papa de influenciar as decisões do poder público, seja em temas recentes, como as pesquisas com células-tronco e a união civil homossexual, seja em antigos dogmas da Igreja, como o aborto. Às 19h15, cerca de 8 mil fiéis, segundo avaliação da polícia, o esperavam na Igreja de Notre-Dame. "Vim do interior e vou dormir na rua para assistir o papa amanhã também", disse Lisette Joffren. "Vim porque nosso país é judaico-cristão, a prova é que nossos monumentos são impregnados dessa civilização." Ao seu redor, católicos vendiam amuletos, pulseiras e moedas que lembravam a passagem de Bento XVI. As vendas, justificavam, eram necessárias para cobrir o custo da viagem, estimado em 1,5 milhão a 1,8 milhão (R$ 3,8 milhões a R$ 4,5 milhões) pelo Vaticano. Hoje, às 5 horas (horário de Brasília), 250 mil pessoas são esperadas na missa campal que Bento XVI oficiará na Esplanada dos Inválidos. À tarde, a comitiva segue para Lourdes. DESAFIO O papa chega à França em um momento crítico para a Igreja. Censo realizado em 2006 apontou que os católicos são 51% da população - eram 90% logo após a 2ª Guerra Mundial. Dos fiéis atuais, apenas 8% seriam praticantes. Em 1965, havia 41 mil sacerdotes católicos. Hoje, são cerca de 22 mil.

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