Movidas a adrenalina

Algumas mulheres, destemidas e aventureiras, desafiam a natureza em busca de emoção

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Por Ciça Vallerio
Atualização:

.Esportes radicais deixaram de ser, faz tempo, uma exclusividade masculina. Thais Marrey Barcellos, por exemplo, tornou-se paraquedista ainda adolescente, quando viajou com uma amiga para os Estados Unidos e fez um salto duplo (com instrutor). Curtiu tanto a adrenalina de estar a 200 quilômetros por hora em queda livre, a 12 mil pés de altura, que não parou mais.

 

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Recorde feminino de 2008, com a participação da paraqudista Thais Barcellos

 

Aos 36 anos, a paulistana tem no currículo dois recordes femininos de Formação em Queda Livre. Nessa modalidade, várias paraquedistas saltam do avião e juntam-se para formar uma figura predeterminada. O primeiro recorde foi em 1998, quando esteve entre 18 paraquedistas. No ano passado, bateu nova marca com 24 meninas que vieram de várias partes do País.

 

"Durante 2007, nos reuníamos em Boituva, interior de São Paulo, um fim de semana a cada dois meses", conta Thais. "Tínhamos de ficar muito afiadas para o dia do recorde, pois a queda é tão rápida que não dá para errar." No grande dia, elas foram divididas em dois grupos de 12, e cada uma subiu em um avião. Depois do salto, tinham apenas um minuto para se unirem, formando uma espécie de estrela.

 

 

Como em um balé flutuante, cada uma cumpriu com precisão suas manobras e, juntas, transformaram o evento em um marco para a história do esporte no Brasil, considerado um dos grandes centros mundiais de paraquedismo. "Além da técnica, é fundamental controlar a adrenalina para saber exatamente o que se está fazendo", avisa Thais.

 

Por causa do paraquedismo, a vida pessoal e profissional da recordista mudou. Em um de seus saltos, conheceu seu atual marido, também praticante do esporte. O casal tem uma filha de 2 anos, Sabrina. Fascinada pela beleza das alturas, Thais decidiu estudar fotografia. "Achava muito egoísmo guardar essas cenas só para mim." Resultado: clicou tantas pessoas saltando do avião que virou fotógrafa especializada em imagens aéreas, com direito a prêmios.

 

 

Fechou sua empresa de decoração de eventos e foi morar em Boituva, onde fica o Centro Nacional de Paraquedismo. Como explica, cada salto é diferente do outro, mesmo que, para quem esteja em terra, pareça sempre igual. "É tudo muito intenso."

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ESCALADA NAS ROCHAS

Também nas alturas, outra aventureira que se tornou fera é Janine Cardoso (foto de capa). Aos 35 anos, conquistou o primeiro lugar no Campeonato Latino-Americano de Escalada, em 2008, e mais seis títulos no País, tornando-se hexacampeã brasileira. "Sempre amei esportes ao ar livre."

 

 

Mãe de Manuela, de 6 anos, Janine tornou-se uma atleta por seu próprio esforço e pura paixão. Sem patrocínio, conta com apoios para, ao menos, evitar gastos com roupas (fornecidas pela loja The North Face), mensalidade de academia (tem passe livre na Casa de Pedra) e passagens aéreas para participar de campeonatos (conta com a ajuda de quem aparecer, como confederações internacionais).

 

Atrás de um rendimento fixo, trabalhou como subgerente de uma loja de moda até conseguir algo melhor. Formada em Jornalismo, hoje colabora para a revista Aventura & Ação, escrevendo artigos sobre montanhismo. Atua também como guia, levando grupos de estudantes para passeios na natureza, e turistas para escalar nos principais paredões do País.

 

Janine cita várias escaladas emocionantes. No Brasil, elegeu a Pedra da Urca, no Rio de Janeiro, como uma das paisagens mais lindas. Mas o lugar que mais amou está em Mallorca, na Espanha, onde escalou uma rocha de 20 metros sem auxílio de corda. "Depois do cansaço, basta se jogar na água cristalina do Mediterrâneo." Mesmo com esse espírito aventureiro, ela é puro zelo. Não é à toa que sua frase preferida é: "coragem é o domínio do medo, não a ausência dele."

 

TREKKING E MOCHILA

Dani Monteiro, a protagonista do programa Extremos, exibido pelo canal Multishow, casou-se em janeiro e, desde julho, vive na estrada para encarar aventuras radicais. O marido, que é funcionário público, espera aflito o retorno da mulher em sua casa no Rio de Janeiro. "A gente sofre muito", confessa Dani, que foi tricampeã brasileira de windsurfe, de 1996 a 1998. "Mas ele entende que o trabalho é essencial para a minha felicidade. E como qualquer mulher, procuro o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional."

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Dani começou na TV fazendo reportagens de esportes radicais, primeiro no programa Rolé, da SporTV, e depois num quadro do Esporte Espetacular, da Rede Globo. E fez de tudo. Só de bungee jumping pulou tantas vezes e em vários lugares do mundo que perdeu a conta. "Tudo começou a ficar fácil, não tinha mais desafios", conta a carioca de 30 anos. Daí apareceu o convite para fazer o Extremos, cuja proposta era justamente resgatar as emoções dessa moça destemida. E conseguiram.

 

Sem o costume de acampar e bem longe do perfil de mochileira, Dani partiu para caminhadas dificílimas. O primeiro desafio foi chegar ao acampamento-base do maior pico do mundo, o Everest, subindo pelo Monte Kala Patthar, localizados na cordilheira do Himalaia. Por causa da altitude, o cansaço e as dores musculares foram tão fortes que quase desistiu.

 

Em outra aventura, fez um trekking de cinco dias até a Cachoeira do Funil, em Mambaí, interior de Goiás, quando atravessou a caverna Tarimba em túneis subterrâneos, com aranhas e morcegos. Em alguns trechos, arrastou-se para poder passar por trechos estreitos e teve de andar dentro d’água – que, de tão gelada, emanava vapor no momento do contato com o corpo quente.

 

"Eu e o cinegrafista entramos em várias roubadas", diverte-se Dani, durante entrevista por telefone, quando tinha acabado de chegar de uma viagem para o deserto da Namíbia, na África. "Hoje, novidade para mim é voltar para casa e ficar assistindo a um filme deitada no sofá com o meu marido."

 

MAR PROFUNDO

E que tal mergulhar à noite, em meio a tubarões, ou explorar cavernas e profundezas do Oceano Atlântico? Essa é a diversão que virou trabalho, resultando num livro assinado por Maristela Colucci, de 41 anos. Adolescente, ela começou a se profissionalizar em fotografia. A partir daí, passou a fazer expedições de pesquisa, principalmente marítimas. De veleiro, já chegou aos cantos mais remotos do planeta. De navio e barco, então, nem se fala.

 

No Círculo Polar Ártico (Pólo Norte), Maristela esteve duas vezes. Conheceu também a Antártida (Pólo Sul), únicos lugares em que ela não mergulhou, é claro. Mas já teve o prazer de visitar todos os principais pontos de mergulho do Brasil, Caribe, entre outros.

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De sua longa experiência debaixo d’água, nasceu um projeto profissional. "A costa brasileira tem uma vida submarina rica, mas como sua água não é 100% translúcida, acaba dificultando a visibilidade no fundo do mar. Encarei isso como um desafio e decidi fotografar tudo da melhor forma possível." Durante 15 anos, Maristela montou um rico acervo e lançou seu primeiro livro, Brasil Submarino, compilação das melhores imagens que fez pela costa brasileira. Depois vieram outros dois livros, sobre suas expedições no gelo.

 

A novidade é que agora ela acaba de lançar SUB, Viagem ao Brasil Submarino – publicação voltada para o público infanto-juvenil. Com esse livro, inaugurou sua editora, a Grão, e pretende ficar um tempo em terra para lançar outros títulos.

 

Fora do Brasil, ela mergulhou duas vezes entre tubarões: nas Bahamas e na Polinésia Francesa. Mas inesquecível para ela foi uma exploração que fez com um grupo em Abrolhos, extremo sul da Bahia, em noite de lua cheia. "A seis metros de profundidade, decidimos apagar as lanternas. O luar estava tão forte que tudo que passava por nós ficava fosforescente", conta.

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