Hospitais perderão R$ 250 milhões com mudança no repasse do DPVAT

Verba podia ser pedida diretamente ao seguro; agora MP permite apenas uso do dinheiro do SUS para tratar acidentados

PUBLICIDADE

Por Emilio Sant'Anna
Atualização:

Uma mudança na forma de pagamento do DPVAT, o seguro obrigatório cobrado anualmente de proprietários de veículos, retirou dos hospitais conveniados ao Sistema Único de Saúde (SUS) o ressarcimento direto pelos gastos com atendimento a vítimas de acidentes de trânsito. A perda dos hospitais com essa alteração pode chegar a R$ 250 milhões, segundo estimativa da Associação Nacional de Trânsito (Anatran). A Medida Provisória nº 451, que entrou em vigor em 1º de janeiro, tem causado confusão no setor porque passa a permitir apenas que o acidentado seja tratado nos hospitais usando a verba vinda do repasse do SUS, que é cerca de 30% mais baixa do que a paga pelo seguro. Antes da mudança, os estabelecimentos podiam, por meio de procuração assinada pelo paciente, requisitar um valor do DPVAT para custear o atendimento. "E se o paciente for levado a um hospital privado sem convênio com o SUS? O texto não é claro e ainda há muita confusão", questiona o diretor de relações institucionais e jurídicas da Anatran, Luis Francisco Flora. "O que essa MP vai fazer na prática é retirar dinheiro do Ministério da Saúde para dar às seguradoras." Segundo a Superintendência de Seguros Privados (Susep), a lei que deu origem ao DPVAT, em 1974, já deixava clara a proibição dos hospitais conveniados ao SUS de cobrar do seguro o ressarcimento. Para a entidade, as mudanças trazidas pela MP 451 seriam uma forma de reforçar o impedimento dos hospitais de realizar uma dupla cobrança. Em nota, a entidade defendeu a medida, dizendo que "o estabelecimento credenciado ao SUS tem de obrigatoriamente receber somente do SUS nos casos de atendimento às vitimas de acidente de trânsito". Segundo a Susep, o sistema "já recebe vultoso repasse do valor do prêmio do DPVAT para este fim, não cabendo exceção nesta hipótese". Em 2008, R$ 4,645 bilhões foram arrecadados com a cobrança do seguro obrigatório no País. Desse valor, pouco mais de R$ 2 bilhões foram destinados ao Fundo Nacional de Saúde (FNS) para custear o tratamento médico dos acidentados e pouco mais de R$ 142 mil foram pagos diretamente às vítimas de acidentes para a reparação de despesas médico-hospitalares. INDENIZAÇÕES A exposição de motivos do texto da MP afirma que o volume de indenizações de despesas com tratamento médico-hospitalar (Dams) vem crescendo nos últimos anos, sendo que 85% dos pedidos são feitos por hospitais e clínicas e não pelo próprio beneficiário. "Esses estabelecimentos obtêm a cessão dos direitos da vítima do acidente de trânsito e deixam de buscar o ressarcimento junto ao SUS, pleiteando a indenização junto ao Seguro DPVAT, porque a tabela por este utilizada para o ressarcimento de Dams é 30% maior", afirma o texto. De agora em diante, caberá ao paciente entrar com o pedido de ressarcimento. Há três situações previstas na lei: indenização por morte ou invalidez permanente, no valor de R$ 13.500, e reembolso de despesas, no valor de R$ 2.700, na qual o paciente precisa comprovar que teve gastos decorrentes do acidente. O acidentado deve procurar o Instituto Médico Legal (IML) para fazer uma avaliação de seus ferimentos e obter um laudo para o pagamento do seguro apenas 90 dias depois. Para a Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados e de Capitalização (Fenaseg) também não há motivos para as críticas. Um técnico do órgão que prefere não se identificar afirma que na prática nada vai mudar a não ser mais transparência no processo. "Os hospitais cobravam o ressarcimento no lugar dos pacientes e acabavam recebendo duas vezes." O argumento não convence o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Goiás, Miguel Angelo Cançado. O órgão enxerga na edição da medida provisória o contrassenso de tratar essa questão como sendo de urgência. "Estamos questionando porque não há urgência ou relevância para que essa matéria fosse editada nessa MP", afirma Cançado. Ele enviou ao Conselho Federal da entidade o pedido para que seja impetrada uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) contra a MP 451. "Não entendo porque isso foi incluído e vamos questionar", diz.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.