Gripe leva famílias a mudarem rotina

Pegos de surpresa, pais buscam alternativa para cuidar das crianças nas férias prolongadas; 25 mi ficam sem aula

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Por Flavia Tavares
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Entre as caixas da mudança para o novo apartamento, Madeleine Simonetti procura, além de uma calça jeans limpa e dos utensílios de uso diário, a solução para um problema que surgiu na última semana: a permanência do filho Gabriel, de 6 anos, por mais 15 dias em casa. As aulas da Escola Fractal, na Pompeia, zona oeste de São Paulo, deveriam recomeçar amanhã, mas foram adiadas - como na maioria das escolas brasileiras. Somando as redes pública e particular de pelo menos seis Estados, estima-se que cerca de 25 milhões de alunos ficarão sem aulas no País por mais uma ou duas semanas por causa da gripe suína. Até anteontem, o País havia registrado 76 mortes, embora o relatório mais atualizado do Ministério da Saúde, fechado no dia 29, computasse 56. Os ministérios da Saúde e da Educação recomendavam que apenas as crianças que apresentassem sintomas de gripe não voltassem às escolas. Mas, depois de a Secretaria da Saúde de São Paulo avaliar que o retorno das férias deveria ser adiado até o dia 17 na tentativa de reduzir a transmissão do vírus A(H1N1), outros Estados (Rio, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul e o Distrito Federal) decidiram seguir o exemplo. Escolas municipais, entre elas as da capital, e particulares adotaram o mesmo caminho. Madeleine está em apuros. Maria do Rosário, que cuida da casa e de Gabriel, não pode mudar seus horários na casa onde trabalha, já que a escola de sua filha também adiou a volta às aulas e complicou a rotina da doméstica. "Essa medida se revelou um transtorno. A escola é pequena e levar meu filho ao cinema ou ao trabalho comigo neste período seria colocá-lo em aglomerações ainda mais perigosas", diz Madeleine, que trabalha na área de controles internos de uma rede de supermercados. Como alternativa temporária, ela contará com a solidariedade de outras mães na mesma situação. "Combinamos um revezamento, deixando as crianças em uma casa onde haja quem possa cuidar delas." A realidade do sistema público e do privado de ensino pode ser distinta, mas a das mães trabalhadoras que dependem de ajuda para criar seus filhos se aproxima. A auxiliar administrativa Vanessa Baez, mãe de Bruna, de 6 anos, e de Gabriel, de 9, ambos matriculados em escolas estaduais, concorda com Madeleine sobre o exagero da medida. "É um absurdo. Não há garantia de que daqui a 15 dias vai ser mais seguro para as crianças", contesta. Em seu caso, o transtorno é duplo: as crianças estudam à tarde, mas passam as manhãs em uma creche municipal, também fechada, e Vanessa não tem empregada doméstica. Vai precisar da ajuda da mãe e do irmão do ex-marido. "Fui pega de surpresa, não tinha me programado para pagar ninguém para olhar os meninos." PRECAUÇÃO Mas há quem veja a opção das escolas como positiva. Cyntia Abramczyk já havia decidido não mandar seu filho do meio, Gabriel, de 4 anos, para a Escola Grão de Chão amanhã. "Entendo que a medida é preventiva, embora não saiba o quanto é eficaz", diz Cyntia. A mais velha, Júlia, de 8 anos, iria voltar para a Escola Vera Cruz normalmente, mas ambas adiaram o retorno. Cyntia trabalha em casa, como decoradora de álbuns de fotografia, e precisa de "paz" no lar. Só quem tem três filhos pequenos - Cyntia é mãe também de Théo, de 1 ano e meio - sabe que isso é impossível com a molecada confinada, depois de vários dias chuvosos. Então, ela tenta organizar com outras mães, tanto de seu condomínio quanto das escolas, a contratação de monitores que possam entreter as crianças nas próximas duas semanas. "Desde que o tempo melhore, porque não podemos aglomerar os meninos no salão de festas do prédio", explica. Não são só as mães que estão sentindo as consequências do adiamento. Embora algumas crianças comemorem uns dias a mais de folga, a maioria cria altas expectativas em relação ao reencontro com os colegas. É o caso de Pedro, de 6 anos, que estuda no Colégio Santa Clara, na Vila Madalena. "A escola é sua única atividade. Ele ficou muito frustrado de não rever os amiguinhos", conta a mãe Vanessa Sá Rocha, gerente-científico em uma empresa de cosméticos. Tiago, de 8 anos, e Beatriz, de 12, filhos da psicóloga Sandra Regina Gross, também lamentaram. "Crianças precisam de rotina", explica Sandra. Especialmente quando as férias são frustradas e sequer assistir ao novo Harry Potter ou ao filme do astro teen Zac Efron elas podem.

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