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Estudo questiona eficácia de prótese que desobstrui artéria

Especialistas debatem se em casos moderados há real vantagem sobre tratamento clínico

Por Fabiana Cimieri
Atualização:

A real necessidade do uso do stent vem gerando polêmica na área médica e tem colocado em lados opostos cardiologistas clínicos e os que fazem a colocação do equipamento. O stent é uma espécie de mola metálica, implantada nas artérias coronarianas obstruídas com o objetivo de normalizar a irrigação sanguínea. Estudos recém-divulgados mostram que, nos casos menos graves de doença coronariana, a implantação de stent pode não reduzir a mortalidade nem o risco de enfarte e tampouco aumentar a qualidade de vida. Apontam ainda que, no caso de doenças coronarianas de risco baixo ou moderado, o tratamento clínico com medicamentos pode ser suficiente para conter a evolução do quadro. O debate ficou mais aguçado depois da divulgação no New England Journal of Medicine, uma das mais conceituadas publicações médicas, do estudo Courage, sigla em inglês para Resultados Clínicos que Utilizam Revascularização e Avaliação de Droga Agressiva. A pesquisa acompanhou 2.287 pessoas com artérias parcialmente obstruídas e angina estável, entre 1999 e 2004. Os pacientes foram divididos em dois grupos. Em um deles, os pacientes seguiram um tratamento clínico rigoroso, tomando medicamentos prescritos adequadamente e na dosagem ideal, além de terem feito mudanças no estilo de vida, como emagrecer, fazer atividades físicas e parar de fumar. No segundo grupo, além de terem feito tudo isso, os pacientes também foram submetidos à angioplastia e à colocação de stent. A conclusão foi que não houve diferenças significativas entre os dois grupos em relação à mortalidade e à redução de risco de enfarte. Há duas semanas, no Congresso Europeu de Cardiologia, um desdobramento do estudo reforçou esse resultado: três anos após o Courage, também não foram registradas alterações significativas na qualidade de vida dos dois grupos. O cardiologista Expedito Ribeiro, do Hospital TotalCor (antigo Santa Bárbara), que fará palestra sobre o estudo no dia 27 deste mês, no Simpósio Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista - Abordagem Clínica, que acontecerá em São Paulo, discorda da conclusão. Ele cita o próprio resultado do Courage: "Depois de mais de 4 anos, 32% dos pacientes em tratamento clínico exclusivo tiveram de passar por uma cirurgia de revascularização. No grupo que fez a angioplastia e colocou o stent, esse índice foi de 22%." O stent, um dos recursos mais utilizados da cardiologia moderna, custa entre R$ 2 mil e R$ 10 mil, em média, no caso dos farmacológicos - modelos mais recentes, que também liberam medicamento. O sistema público de saúde só fornece o modelo mais simples. Em 2007, o Ministério da Saúde gastou cerca de R$ 161 milhões para realizar 33.560 angioplastias (intervenções cirúrgicas para corrigir obstruções nos vasos e implantação de stents). Ou seja, R$ 4.797,37 por procedimento. "Tem de separar o joio do trigo. Muitos hemodinamicistas (especialidade que estuda as leis reguladoras da circulação de sangue nos vasos) vêem uma obstrução e querem logo colocar um stent", diz Carlos Scherr, doutor em cardiologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, para quem está havendo um abuso na colocação desse tipo de prótese. "Exageros podem ocorrer em um ou outro lugar, mas nos centros médicos de excelência ninguém indica uma angioplastia sem necessidade", defende Ribeiro. METODOLOGIA O resultado do Courage ainda provoca polêmica. Enquanto cardiologistas clínicos viram nele um reforço à idéia de que o tratamento com medicamentos feito corretamente é capaz de controlar a doença coronariana em seu estágio inicial, intervencionistas criticaram a metodologia. "O tratamento clínico foi dos mais bem-feitos que já se viu, enquanto a angioplastia não foi feita de acordo com as melhores práticas", rebate Fausto Feres, diretor do Serviço de Cardiologia Invasiva do Hospital Dante Pazzanese. Enquanto nos melhores centros a taxa de insucesso da angioplastia não passa de 5%, no Courage foi de 11%. Para Scherr, o fato de em alguns casos a doença evoluir e exigir procedimentos invasivos não invalida os benefícios do tratamento clínico.

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