Alunos da USP prestam auxílio a cidade no Vale do Jequitinhonha

Projeto Bandeira Científica assiste municípios carentes desde 1998; participaram mais de 200 voluntários

PUBLICIDADE

Por Alexandre Gonçalves e ITAOBIM (MG)
Atualização:

Daniel Evangelista Muniz vai melhorar seu desempenho escolar no próximo ano. O garoto de 7 anos descobriu que precisaria vencer quatro graus de miopia e outros três de astigmatismo para ver o que a professora ensinava. Seu benfeitor foi um exército de 202 alunos, pesquisadores e professores da Universidade de São Paulo (USP). Entre os dias 7 e 16 de dezembro, eles atenderam a população de Itaobim (MG), no Vale do Jequitinhonha, semiárido mineiro, a 620 km de Belo Horizonte. O projeto, chamado Bandeira Científica, assiste municípios carentes desde 1998. O pesquisador Luiz Fernando Ferraz da Silva, da Faculdade de Medicina da USP, um dos idealizadores do projeto, recorda que a Bandeira Científica recupera uma iniciativa semelhante interrompida em 1969. Itaobim conta com 1 hospital, 7 postos de saúde, 4 unidades básicas (UBS) e 3 equipes do Programa Saúde da Família (PSF). A estrutura responde bem pela atenção na zona urbana, onde vivem cerca de 75% dos moradores. Mas, vencidas as doenças mais comuns, surgem demandas de outras especialidades médicas. Apenas um oftalmologista cuida da população de 21 mil habitantes pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Suas visitas são mensais e a fila de espera é grande. "Temos dificuldade para contratar especialistas. Consideram que o SUS paga pouco e não querem vir trabalhar aqui", diz a secretária municipal de saúde, Maflávia Ferreira. Ela estima que 25% da população recebeu atendimento médico na Bandeira Científica. A situação é mais difícil na zona rural e nos povoados fora do centro urbano de Itaobim. Da janela do ônibus municipal, os estudantes viam mulheres lavando roupa nas pedras do Córrego São João, enquanto crianças refrescavam-se na correnteza. Em 2001, 80% dos moradores da comunidade local tinha "chistose" - corruptela regional para esquistossomose. Campanhas anuais da prefeitura estabilizaram a incidência em 25% - porcentual ainda elevado. "Quando chega o calor, é difícil convencer as pessoas a não entrarem na água", diz Maflávia. Fabrício Pereira, 9 anos, livrou-se da verminose no ano passado. A mãe, Maria Aparecida Pereira, soube dos visitantes e trouxe o filho para ser examinado na escola do povoado. A família mora em um pequeno sítio próximo ao povoado de São João. Os avós já viviam na mesma casa de adobe, piso de cerâmica e telhas irregulares. Não há rede de esgoto ou fossa sanitária. Todos consomem a água do córrego armazenada em um filtro de barro. A luz elétrica já chegou ao casebre de dois cômodos para cinco pessoas, mas ainda falta geladeira e televisão. Trabalham na roça de mandioca e milho, mas o dinheiro do Bolsa-Família constitui a principal fonte de renda. ROTINA Não havia só médicos na Bandeira Científica. Estudantes de Nutrição, Engenharia, Psicologia, Fisioterapia, Odontologia e Jornalismo também trabalharam na expedição. O prédio da prefeitura, recém-construído, e um salão do Country Club de Itaobim serviram como alojamentos. Merendeiras escolares, coordenadas pelas nutricionistas do grupo, preparavam as refeições. A rotina começava às 6h30. Depois do café da manhã, veículos da prefeitura levavam as equipes para os locais de atendimento. Foram gastos R$ 400 mil no empreendimento, metade em dinheiro e metade em doações de insumos e infraestrutura. Empresas como a farmacêutica Sanofi-Aventis e o Centro Ótico Miguel Giannini colaboraram com o projeto. A estudante de jornalismo Lia Segre considera a Bandeira Científica uma ótima oportunidade para promover a integração dos conhecimentos universitários. "Sem dúvida, ajudamos a cidade", afirma Lia. "Mas os estudantes são os maiores beneficiados."

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.