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Déficit de atenção não é só coisa de criança

Cada vez mais adultos na faixa dos 40 anos são diagnosticados com TDAH, o distúrbio da desatenção e da hiperatividade que pode causar estragos enormes na vida pessoal e profissional se não tratado

Por Adriano Predeus
Atualização:

Christian vinha observando há algum tempo que sua filha Beatriz, de 7 anos, se distraía com facilidade. Um fato em especial lhe chamou a atenção. Certo dia, ele pediu para a menina buscar um brinquedo no quarto. Beatriz se dispersou com outra coisa e não atendeu seu pedido. O mesmo se repetiu em ocasiões diferentes, várias vezes. Além dos esquecimentos, vieram à tona dificuldades no aprendizado. Os pais buscaram auxílio profissional.

Segundo dados da Associação Brasileira de Déficit de Atenção (ABDA), 4% da população adulta tem déficit de atenção Foto: Net-Efekt/Creative Commons

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Beatriz foi diagnosticada com transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). Para alívio da família, o tratamento foi um sucesso. Christian, de 40 anos, relatou ao médico os problemas que teve, na infância e na sua vida adulta, também por causa de uma desatenção exacerbada. Feitos os testes e as avaliações necessárias para um diagnóstico correto, foi detectado que Christian também tinha o transtorno.

Muitos pais e mães estão descobrindo, por volta dos 40 e poucos anos, às vezes um pouco antes ou depois (na fase em que seus filhos começam a ser mais exigidos na escola), que também têm o distúrbio. Segundo dados da Associação Brasileira de Déficit de Atenção (ABDA), 4% da população adulta tem déficit de atenção. Aproximadamente 80% dos casos tiveram início na infância, a maioria deles não diagnosticados. Hoje, uma em cada vinte crianças sofre com a doença.

O TDAH é caracterizado por três sintomas principais: desatenção, hiperatividade e impulsividade, sendo o primeiro o mais comum. O transtorno interfere nas chamadas funções executivas - organização, planejamento, administração do tempo -, atrapalhando o desempenho no trabalho, nos relacionamentos e no bem estar psíquico do pacientes.

Adultos com TDAH estão mais predispostos a desenvolver depressão e ansiedade, uma vez que ficam mais inseguros e com baixa auto-estima. No trabalho, podem ter desempenho abaixo de sua capacidade. Com frequência se esquecem de datas e reuniões importantes, são desorganizados, procrastinadores e inquietos e agitados - não ficam sentados por muito tempo. Como têm dificuldade de atenção, muitas vezes não completam cursos, prejudicando sua formação. Têm temperamento explosivo, sofrendo as conseqüências no ambiente profissional, com demissões ou estagnação na carreira, e nos relacionamentos, com separações. São impulsivos e tomam decisões precipitadas, geralmente prejudiciais. Estão propensos a abusar de álcool e drogas e a serem compulsivos (com compras, jogos, comida, etc.). E correm mais riscos de se envolverem em acidentes, por distração.

Há duas explicações para o TDAH. Um grupo de especialistas acredita que a doença ocorre por causa da alteração nos níveis dos neurotransmissores dopamina e noradrelina, o que impediria os neurônios de receberem informações e processá-las de forma correta. O outro grupo defende a tese de que o distúrbio é decorrente de uma falha nos receptores dessas substâncias que ficam dentro das células. Apesar da divergência, é certo que o cérebro de quem tem o distúrbio funciona de maneira diferente daqueles que não têm o TDAH. Foram detectadas diversas alterações funcionais no cérebro de pacientes com o transtorno em exames de neuroimagem. Ou seja, trata-se de um problema fisiológico. Não de preguiça, irresponsabilidade e falta de vontade, como se pensava até pouco tempo atrás.

Psicólogos, psiquiatras e neurologistas são os profissionais que ajudam no tratamento do TDAH. Só eles são capazes de diagnosticar a doença e se, necessário, indicar um tratamento. Psicoterapia, mudanças de comportamento e medicações apresentam ótimos resultados. Christian, após se identificar com os sintomas de sua filha, buscou tratamento. Ele lamenta não ter se tratado antes: ”Minha vida pessoal e profissional seria muito mais fácil”. Hoje, pai e filha continuam em tratamento, um prestando atenção no outro.

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Adriano Predeus é psiquiatra e colaborador do canal Longevidade do Estadão

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