Televisão aposta tudo na geração do milênio

'As pessoas têm uma ideia abrangente de quem é a geração do milênio, mas eu não sei o que essa palavra significa', diz cantora

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Por Sarah Lyall
Atualização:
Representante da geração do milênio Foto: Pixabay

O setor da televisão está dando muita atenção à geração do milênio hoje em dia. Bilhões de dólares estão em jogo, ao lado da reputação de executivos do segmento que veem essa grande e diversificada geração - geralmente definida como os nascidos entre 1977 e 1995 - como os grandes consumidores do momento em um ramo que se modifica em ritmo desconcertante.

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É como se as empresas estivessem jogando um bolo de dinheiro no muro da geração do milênio, esperando que uma parte fique grudada. A Verizon Communications e a Hearst se uniram para produzir duas novas multiplataformas de vídeo online, uma destinada à "geração do milênio do interior", seja ela quem for. A Condé Nast Entertainment criou a faixa demográfica "geração do milênio refinada", cujos membros parecem preferir cerveja artesanal à industrial. Ao anunciar seu novo serviço de transmissão online, a HBONow, a HBO afirmou que seria um "míssil guiado pelo calor da geração do milênio".

Mas o que - como Freud poderia ter perguntado caso vivesse nos Estados Unidos em 2016 - a geração do milênio quer? Alguém sabe mesmo? É justo juntar no mesmo balaio um grupo de pessoas com idades entre 21 e 39 anos? Eu fiquei curiosa e decidi realizar meu próprio estudo não científico com essa turma e suas atitudes em relação à televisão.

Não é difícil achar alguém dessa geração; existem 79,8 milhões deles nos Estados Unidos. No Brooklyn Roasting em Clinton Hill, Brooklyn, por exemplo, achei um bem ali no balcão, discutindo com o barista sobre o que significa "refil". Ele não podia conversar, mas Rob Szypko, 25 anos, que fuçava alguma coisa no notebook, tinha um tempinho. Ele tirou os fones de ouvido.

"Eu sofro com o termo 'geração do milênio'. Talvez seja uma coisa típica para alguém da minha geração falar, mas eu não me acho parecido com os outros só porque aconteceu de ter nascido no mesmo intervalo de 15 anos", diz ele.

Era um argumento válido. Gente mais velha costuma reunir a geração do milênio como um grupo enorme e misterioso de jovens que julgam ter direitos adquiridos e que sempre estão com o telefone na mão. É divertido zombar deles, da mesma forma que as gerações anteriores também foram motivo de zombaria.

Uso de smartphones é disseminado Foto: Sebastião Moreira/EFE

"Acho que existe algo errado com essa geração", diz Jack Donaghy, o personagem de "30 Rock" vivido por Alec Baldwin, quando um candidato a emprego da geração do milênio anuncia que precisa ir embora por causa de sua "liga irônica de beisebol" e que "não está interessado no cargo se não for para viver sendo elogiado".

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Ao contrário dessa personagem ou, por exemplo, os protagonistas da geração do milênio sempre conectados, sempre chapados e sempre desafortunados de "Broad City", Szypko já tem um emprego respeitável - ele trabalha na prefeitura. Mas não tem televisor. Costuma assistir programas no Netflix e no Hulu. Ele só assiste uma série quando tem certeza de que será boa. Szypko não gosta que digam do que ele gosta.

"Uma das coisas com que as pessoas se aborrecem é a sensação de que outros estão cuidando das coisas em seu lugar", ele fala em relação à sua faixa etária. "Se o Netflix diz: 'Ei, Rob, acho que você pode gostar deste título', se a escolha combinar demais, isso tira parte da graça de descobrir uma experiência por si mesmo. Se eu não preciso passar da segunda linha da minha página no Netflix para descobrir o que quero, tem algo errado."

Deixando Szypko com seus equipamentos, parti para Williamsburg, outra parte do Brooklyn lotada com pessoas dessa geração. Encontrei duas - Austin McAllister e Ryley Pogensky, ambos de 26 anos - em uma esquina, tentando atrair a atenção de sua amiga Danielle, que estava cruzando a rua a seis metros dali usando fones de ouvido. Ela não respondeu nem quando nós três gritamos, então eles mandaram uma mensagem de texto para falar de sua localização.

"As pessoas têm uma ideia abrangente de quem é a geração do milênio, mas eu não sei o que essa palavra significa", diz Austin, que é cantora.

Pogensky, que se identificou como editor de uma "empresa de mídia da geração do milênio", desdenhou de programas de televisão que tentam retratar sua geração - "Girls", por exemplo. "Eles se esforçam demais - aquela noção de 'hipster' da geração. Eles usam gírias que ninguém usa, que seu pai usaria."

"É de rolar de rir", acrescenta Austin.

"Ela está sendo sarcástica, não fala de verdade", diz Pogensky.

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Eles têm televisores, mas ninguém tem TV a cabo. "Ninguém tem TV a cabo", afirma Danielle, 34 anos, que finalmente chegou à esquina e não quis dar seu sobrenome. Eles tiveram diversos tipos de empregos. Danielle: enfermeira, empregada doméstica, operária do sexo. Os gostos são quase agressivamente idiossincráticos.

"Eles compõem a geração mais diversificada de adultos da história dos EUA, então essa é uma grande questão para o setor do entretenimento. Como fazer a programação para uma geração tão diversificada que não carrega talão de cheque, quando muitos deles não carregam dinheiro, a maioria está esperando para casar e ter filhos e têm altas expectativas de diversidade e mais dívidas do ensino superior?", diz Jason Dorsey, cujo cargo de diretor de estratégia e pesquisa da geração do milênio do Center of Generational Kinetics, em Austin, Texas, mais parece um programa irônico de televisão.

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Verdade. "Nada engloba todos eles, mas existem temas que parecem ser importantes", declara Tom Ascheim, presidente da Freeform, como a ABC Family agora se chama. Embora o público alvo da Freeform seja praticamente da geração do milênio, o canal é mais especificamente voltado para uma faixa etária - pessoas de 18 a 34 anos - do que a uma geração, com base no fato de que, o que uma geração quer, muda à medida que ela envelhece.

"O que unifica nossos programas é que eles são centrados em jovens em um mundo adulto que gira ao seu redor e que eles têm o poder de modelar", explica Ascheim.

Parece verdade: a geração do milênio quer modelar seu mundo. "Quanto tempo isso vai demorar?", pergunta Stephane Rochefort, 33 anos, que trabalha com vendas e estava caminhando pela rua quando lhe perguntei sobre seu hábito de assistir televisão. Ele tinha pressa. "Eu não assisto televisão, mas às vezes acompanho esportes na internet", responde, já indo embora.

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