Cresce o número de espaços voltados à reflexão sobre as relações interpessoais e o bem viver

Tendência reúne pessoas em rodas de conversa para discutir como lidar de melhor forma com família, amigos, trabalho e o mundo ao redor

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Por Pedro Prata
Atualização:
Relações pessoais são tema de reflexão por grupos de debate (foto ilustrativa, 2013) Foto: Epitacio Pessoa / Estadão

A vida apressada nas cidades está deixando pessoas com a sensação de que não estão vivendo a plenitude de suas relações pessoais. Seja no convívio familiar ou no profissional, muitos alegam que o estresse do dia a dia não lhes permite estabelecer conexões verdadeiras com os outros. Em virtude disso, cresce o número de espaços coletivos destinados a refletir e discutir sobre o bem viver. O E+ conversou com especialistas que têm algum contato com esses espaços para falar dessa nova tendência.

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A psicóloga psicoterapeuta Lucia Rosenberg acredita que o uso excessivo da tecnologia está distanciando as pessoas, impedindo-as de terem relações de verdade. Nesse sentido, ela vê com bons olhos a difusão desses espaços de discussão: "Espaço para reflexão, conhecer-se mais, espaço para debate, enfim, acredito que quanto mais ampliarmos o espaço da conversa, melhor".

"A ideia é que a gente possa ter mais reflexão e mais consciência nas nossas ações todas", diz Vivian Wrona, uma das fundadoras do Matutaí, fórum de debate voltado para pais que procuram refletir melhor sobre a educação de seus filhos e sobre as relações familiares.

Ela acredita que os pais deveriam fazer uma pausa na correria do dia a dia e dedicar parte de seu tempo a pensar em como estabelecer relações mais afetivas para com os filhos, uma vez que eles crescerão e constituirão a sociedade do futuro.

"A gente precisa conversar com os filhos porque é dessa forma que eles vão crescer, que eles vão encarar a vida daqui para frente. O impacto é muito grande e, por isso, a responsabilidade é maior", defendeu Vivian.

Lucia explica que as crianças que crescem em um lar de maior diálogo e interação desenvolvem melhor a criatividade, a habilidade de se expressar e o lado comunicativo. "Pessoas que têm uma família nutritiva e que são criadas em um berço de aceitação, são pessoas mais confiantes e que saem pela vida podendo semear mais aceitação", explicou.

Os encontros mensais do Matutaí acontecem das 12h às 14h. Segundo Vivian, o horário foi escolhido para que os pais fossem obrigados a quebrar sua rotina e se permitirem duas horas de distanciamento dos problemas do cotidiano. "Esses encontros são como um oásis", definiu.

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"Nossa intenção é que sejam encontros transformadores, os bons encontros são os transformadores. A gente não gostaria que as pessoas saíssem e, no mesmo instante, já voltassem para suas rotinas. O mais legal é quando dá para levar um pouco do encontro para o cotidiano", ponderou Vivian. Ela diz que a ideia dos encontros é difundir as ideias para que cada membro do encontro as aplique na sua vida.

Ela contou o caso de uma mãe que compareceu a um dos eventos de conversa e que se incomodava muito quando suas duas filhas pequenas brigavam. Quando uma das meninas chegou a dizer para a outra que "ia matá-la", a mulher ficou sem saída e reprimiu a garota com discursos moralistas que, muitas vezes, não faz sentido algum para as crianças. Quando, no entanto, a mulher resolveu responder ao comentário da menina com uma piada e tratar o tema de forma mais lúdica, a filha aprendeu a lição e não repetiu o gesto.

Lucia também defende que as relações sejam pensadas para incentivar a empatia e o reconhecimento do ser humano entre todos os membros familiares: "Recomendo que os pais se abram para os filhos e contem sobre a sua história, sobre as pessoas que existem atrás dos papéis de pai e mãe, para que se abra mais interfaces de comunicação entre os filhos e os pais".

Vivian observa que uma das maiores dificuldades dos pais, hoje em dia, é saber lidar com a inserção das tecnologias na vida dos filhos. Para ela, essa é uma questão muito nova e que traz desafios pois seria irreversível e, ao mesmo tempo, é preciso estabelecer limites. Ela ainda relata o uso comum de equipamentos eletrônicos enquanto distrações para as crianças.

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Lucia não concorda com essa prática e defende que haja interações reais entre pais e filhos. "Essa é uma das minhas recomendações mais fortes: que se mantenha o olho no olho e o desenvolvimento da intimidade familiar, que cada membro da família se saiba, saiba da sua história, das suas potencialidades e seus limites", explicou.

Apesar da família ser parte fundamental da vida, os espaços de discussão não estão voltados apenas às relações com os filhos. Vivian acredita que é preciso tomar consciência sobre todas as nossas ações e comportamentos, parar um pouco para entender a importância real de tudo o que fazemos e rever nossos valores, atitude que muitas vezes fica esquecida por conta da pressa do cotidiano.

Ela levantou o questionamento: "A gente está no tempo presente mas não está no lugar presente. As pessoas não admitem isso. Todo mundo tem suas justificativas e acho que eu tenho o intuito de procurar mais consciência. Quantas experiências fundamentais estamos perdendo?".

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O próximo encontro da Matutaí se dará no dia 10/10, das 12h às 14h, com a psicóloga psicoterapeuta Lucia Rosenberg e tratará do "Cultivo dos vínculos familiares". Conheça esse e outros projetos com a mesma proposta:

Matutaí

Projeto Awake

Pausa para Prosa

The School of Life

*Estagiário sob supervisão de Charlise Morais

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