Seleção de poucos

Casa das Rosas, sede da primeira CAD Brasil, reúne apenas 38 espaços

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Por Bete Hoppe
Atualização:

Se a Casa Cor é uma festa, o CAD Brasil - Casa Arte & Design é uma reunião tipo petit comité. Comparar é inevitável. Afinal, o mentor da primeira edição desse evento em São Paulo é Javier Malbrán, que lançou e comandou a Casa Cor de 1987 a 2000. O CAD atual resgata as origens de uma mostra concebida para apresentar ambientes que devem ser apreciados com calma. Por isso, são apenas 38 espaços instalados na Casa das Rosas, patrimônio histórico projetado por Ramos de Azevedo, em 1928, na Avenida Paulista. O imóvel será devolvido à cidade com benfeitorias: novas pintura, rede elétrica e hidráulica, restauração de piso e telhado, criação de banheiro e elevador para cadeirantes. Tudo resultado de ambientes inspirados no tema "Poesia" - e criados para um casal com filhos adolescentes. Resultado: espaços sem modismos. O living de Rosa May Sampaio tem a leveza das fábulas de La Fontaine e transpira o naturalismo em voga na época. Por isso a escolha recaiu sobre mesas laterais de folhas e aparador de tronco (Juliana Benfatti), poltronas Luís 16 revestidas com veludo tijolo (Casa Fortaleza) e luminária de cristal de Luís Sapata. O cinza está presente na cortina de seda (Empório Beraldin) e na madeira da estante com pátina branca. A literatura também inspirou Camilla Matarazzo, que buscou na intensidade de Pablo Neruda o norte para a sala de jantar. Ali as paredes apóiam quadros com versos do poeta e a mesa de laca laranja combina com a madeira do teto e das cadeiras Império, com assentos revestidos de sacas de café. Na cozinha industrial de Flávia Ralston, a mandala no piso antigo de ladrilho hidráulico se repete, moderna, nos adesivos aplicados em luminárias de acrílico e nas pastilhas de vidro preto com fios de ouro (Color Mix) no frontão, onde estão trechos de If, do poeta inglês Kipling. Os metais originais foram polidos, a bancada ganhou laminado cinza com veios e os eletrodomésticos são de aço escovado (Viking). Abrigo dos poetas, a biblioteca de Frederico Morán e Haroldo de Barros é despojada. Os livros têm arrumação solta e o democrático ambiente mescla poltrona com encosto de Aubusson e assento de algodão, sofá de linhas clássicas estofado com juta, papeleira antiga (Entreposto), cortina listrada e tela de plasma. No banheiro concebido por Beatriz Dutra, preto, branco e dourado se sobressaem, em especial na moldura do espelho, de prata envelhecida, e no piso, com losangos de granito preto e mármore de Carrara. Revestimentos de época No topo da escada, o hall é tão de vanguarda quanto o poeta medieval Dom Dinis, que inspirou Márcia Nogueira e Maria Célia Cury a aliar peças de contornos clássicos com roupagem moderna. Exemplo: sofá de veludo preto, renovado pela pintura de mesma cor na estrutura, ao lado da mesa de acrílico (Conceito: Firma Casa), ambos sob o lustre de cristal preto e ouro envelhecido com cúpulas de tela também preta (MVM). O branco impera na saleta e no quarto do casal. Para criar a sala íntima, William Maluf partiu não da poesia de Fernando Pessoa, mas sim dos lustres do anos 1960 do amigo Germano Mariutti, que iluminam bufês de palhinha branca (Estúdio Jacarandá). Do poeta português, apenas o célebre verso "tudo vale a pena quando a alma não é pequena", bordado na almofada. No quarto de Alberto Lahós e Marco do Carmo, sonetos de Luís de Camões surgem em adesivos nas paredes, aguados com tinta branca. O ponto alto são os revestimentos de época: cabeceira de quadrados de tecido branco e cômoda forrada de couro de cobra sintético. A sala de leitura é concretismo puro. Cecília Pastore traduziu a poesia de ruptura nas cores preto, branco e cinza, e elementos geométricos, sobretudo no mobiliário escultórico, como o sofá circular e a poltrona bola, ambos de couro preto, e a mesa desestruturada de vidro, tudo da suíça Staaten. Na varanda lateral, Clélia Angelo foi fiel ao pernambucano João Cabral de Melo Neto e conferiu sofisticação ao rústico. Abusou de fibras naturais, tons terrosos e madeira. Generosos sofás ficam em meio a cactos e almofadas impressas com versos de Morte e Vida Severina. Já a geração beatnik (anos 50/60) dá o tom na varanda do térreo. Carmen Mansor, Fernando Azevedo e Tiza Kann misturam sofás de linho lavado, tronco de eucalipto de reflorestamento e mesa de freijó claro. Lugar para ler (há uma estante até o teto farta em livros) e apreciar o jardim ou o vaivém da Avenida Paulista.

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