Especialistas dizem o que não pode faltar em um bom designer

Cursos em São Paulo atraem apaixonados por design

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Por Natalia Mazzoni
Atualização:
Oficina do Lab 74 em parceria com os designers do Neute Chvaicer ensina a fazer marcenaria para luminárias Foto: Gabriela Bilo/Estadão

"Você percebe um apoio na região lombar, sente os pés bem apoiados no chão, o cotovelo pousa sobre o braço da poltrona. Você relaxa e, naturalmente, a mão fica mais aberta e apoiada sobre a parte mais larga do braço.” É com essa racionalidade e detalhismo quase poético que o designer Carlos Motta em seu livro Carlos Motta e a Vida (Bei Editora, 180 págs.) descreve o que para ele é uma cadeira perfeita.  Motta é mestre em fazer madeira virar móvel, sobretudo cadeira, pensa e vende design há 40 anos. “Procuro o óbvio, quero fazer uma cadeira completamente confortável. Saio do bidimensional e vejo isso virar algo que pode ser usado por qualquer pessoa”, diz.  Assim como ele, a designer e diretora de criação Baba Vacaro acredita que mais do que causar impacto, o designer não deve perder de vista a função da peça que está criando. “É difícil desvencilhar o design da funcionalidade. A arte, sim, tem como maior intuito comover, mas o design deve ser sempre pensado para ser o mais funcional possível”, afirma.

O designer Carlos Motta em seu ateliê na Vila Madalena, onde vende peças de design há 40 anos Foto: Zeca Wittner/Estadão

A paixão dos dois profissionais está ligada à recente trajetória do design nacional – seja desenvolvendo mobiliário, seja propagando o valor de criações de outros designers – e é o sentimento que tem movido jovens paulistanos interessados no tema. Palco da quarta edição do Design Weekend, festival com lançamentos, instalações e seminários que termina hoje, São Paulo tem abrigado iniciativas para divulgar o tema, assim como oficinas e cursos livres em que qualquer pessoa pode aprender a pensar como um designer – se a partir daí o mercado vai, de fato, ganhar profissionais é uma outra história.  Novos nomes do cenário local e especialistas no assunto citam, a seguir, características que não podem faltar a um bom design – para quem pensa em se tornar profissional ou para aqueles que procuram os cursos apenas para saber se são capazes de criar, com as próprias mãos, uma peça que fará parte da decoração de casa – como aconteceu com a repórter. Pensar em cada objeto existindo como parte de um espaço funcional e vivo é o que o designer e curador Bruno Simões acredita ser o primeiro passo. Em seu processo criativo, os protótipos são imprescindíveis. “Preciso tocar, olhar de todos os ângulos. É quando tenho a real ideia das proporções.”  Rodrigo Silveira, que em sua marcenaria cria peças de edição limitada e recebe turmas de alunos interessados em aprender com ele, tem como uma constante experimentar processos construtivos e tentar novos encaixes. “Observar os materiais disponíveis e a partir deles pensar o projeto é importante. Tem de testar, resolver defeitos, fazer funcionar”, diz.

Hugo vê a busca por funcionalidade como o maior desafio de um designer Foto: Zeca Wittner/Estadão

Aos 22 aos, Hugo Sigaud já se destaca no mercado com seus móveis e luminárias. Estudante de arquitetura, ele vê a busca por funcionalidade como o maior desafio de um designer. “Nosso trabalho é fazer objetos que não sejam só mais uma coisa no meio de milhões de outras. É tirar uma ideia do papel e fazer com que ela chegue ao cliente com o menor gasto possível de energia e matéria-prima.”  Para os criadores do Atelier Bam, Juliana Bertolucci e Clément Gérard, fazer design inteligente é identificar necessidades e entender materiais. “Juntamos aspectos positivos do contexto de onde a peça vai ser criada, e onde vai ser usada, com as necessidades que o cliente nem sabe que tem”, diz Juliana.  Baba Vaccaro acredita que o estudo que antecipa a prática é mesmo importante. “Um banco pode ser feito por alguém que não usou nenhuma técnica e ser um bom banco. Mas o designer vai sempre estudar para que aquele objeto seja produzido e usado da melhor forma. Esse é o diferencial e qualquer pessoa pode aprender essa metodologia.” 

Juliana Bertolucci e o francês Clément Gérard do atelier Baam Foto: Zeca Wittner/Estadão

Mesmo que passe por questões absolutamente práticas, o design, para a professora e filósofa Maria Cecilia Loschiavo, autora de Móvel Moderno no Brasil (Ed. Olhares, 264 págs.), deve comover. “Criar é o resultado da sinergia entre o coração, a razão e as mãos. É mobilizar a energia inquieta, criativa e às vezes transgressora que integra o perfil de um designer.”  E esse seria o diferencial de uma peça, o que a destacaria no meio de tantas outras já produzidas, segundo o curador de arte e design Waldick Jatobá. “Um bom designer enxerga não só a necessidade, mas também a poesia. Ninguém precisa comprar mais nada, as pessoas só vão comprar aquilo que as comove.”

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