Entre tecidos e manequins

Em seu endereço paulistano, o estilista Guilherme Guimarães vive o glamour da alta costura

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Por Monica Nobrega
Atualização:

Diante da porta do elevador, os biombos espelhados no hall prenunciam: neste apartamento dá-se muito valor à imagem. A segunda pista sobre o proprietário vem logo a seguir - as paredes forradas de algodão listrado em dois tons de bege (de várias cores, o metro linear com 1,40 m de largura custa cerca de R$ 48, na Donatelli). Toda a área social tem paredes revestidas de tecido e espelhos, do hall à saleta de trabalho. E é nessa atmosfera, no sexto andar de um edifício no Centro, que mora o estilista Guilherme Guimarães, 66 anos, 50 dedicados a vestir mulheres. Exatamente, apenas mulheres. "Alta costura foi feita para elas", diz o costureiro. Que acrescenta, categórico: "Não faço questão de ser chamado de estilista. O título nem existia quando comecei." Aliás, há poucas coisas das quais ele ainda faz questão - e as revistas de decoração, que ocupam corredores, armários e prateleiras, integram a seleta lista de preferências. Tudo cuidadosamente organizado. As publicações são separadas e empilhadas por título e data, e o post-it é usado para marcar a página de interesse. Guilherme aprendeu moda por conta própria, graças à observação da high society e ao gosto por tudo o que transpirasse glamour. Nunca freqüentou cursos, porque eram arrastados e ele tinha pressa em ficar rico, famoso. Gaúcho, foi morar no Rio de Janeiro aos 2 anos e, em São Paulo, em 1985. Entre esses dois endereços, vieram temporadas em Nova York, onde fez o primeiro desfile da carreira, aos 18 anos, e Paris, quando trabalhou na Maison Dior. Quanto à vida, feita de luxo, teve seus altos e baixos, como a criação dos figurinos para o filme Terra em Transe, de Glauber Rocha (de graça) e o assalto à loja que abriu nos anos 80 em Nova York, quando perdeu tudo. Hoje, Guilherme vive entre São Paulo e Rio, 15 dias em cada capital. O endereço carioca é um dúplex lotado de móveis, obras de arte e antiguidades. Já o paulistano, comprado há seis anos, é amplo e vazio, livre para a circulação. O carpete e as cortinas da área social são bege, dando continuidade ao tom das paredes. Guilherme nunca contratou decorador, porque cuida pessoalmente das reformas que fez ao longo da vida. E reforça: decoração, livros e moda são os únicos temas que o interessam, embora considere as coleções dos estilistas atuais de mau gosto e sem estilo ("Carlos Miele é exceção"). Não assiste a desfiles nem pela televisão - nem sequer tem uma, aliás. Computador e telefone celular são outros utilitários tecnológicos que se nega a ter em casa. Marcante é a simetria que ele procura imprimir nos ambientes, de forma quase obsessiva. Crê que essa disposição de móveis e objetos estimula a inteligência. Na sala defronte à entrada, a mesa central tem uma poltrona estilo Luís XVI em cada lado, e sobre o tampo de mármore, o potiche chinês (na L?Oeil, modelo clássico de porcelana chinesa, com 30 cm de altura, custa R$ 458) foi posicionado tão cuidadosamente que, visto de frente, o pegador da tampa coincide com o encontro das portas que dão para a varanda. No estar, ao lado, destacam-se os pares formados pelos sofás e estantes de gesso de estilo neoclássico. O quarto do costureiro é elegante e quase vazio, com paredes cinza e cama de solteiro acompanhada por mesinha repleta de revistas - só. A rotina muda pouco: acorda às 6h30, dedica o dia ao trabalho, vai dormir às 9h30. Não freqüenta festas nem eventos sociais. "Hoje, sou reservado. Eu me basto", diz. E emenda: "Não tenho vontade de conhecer mais ninguém. Ou melhor, gostaria de ser apresentado a apenas uma pessoa, o cantor Ed Motta." Dos outros três dormitórios, um foi transformado em closet, o outro em quarto de vestir, e o terceiro em escritório. Nesse, entre tecidos e manequins para prova das roupas (cerca de R$ 553, na Propavit), Guilherme recebe clientes diante do espelho que ocupa uma parede. "Acho mais fácil listar as damas da sociedade brasileira que nunca foram minhas clientes do que as que já foram", diz ele, que narra com orgulho a ocasião em que foi apresentado à princesa Diana, pela então embaixatriz Lúcia Flecha de Lima. Conta ter ouvido da princesa que ela gostaria de usar uma criação sua numa cerimônia oficial, se não fosse obrigada pelo protocolo a vestir exclusivamente roupas de costureiros ingleses. Acontece que Guilherme considera a ex-embaixatriz sua melhor cliente. "Outras, como Carmem Mayrink Veiga e Cristiana Neves da Rocha, são grandes clientes e amigas, mas durante 40 anos Lúcia vestiu apenas as minhas criações em eventos oficiais." Fotos dessas mulheres e de tantas outras enfeitam mesas de canto na varanda e as paredes do escritório.

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