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Ser mãe é padecer na internet

Opinião|Prometo dizer a verdade, somente a verdade, nada mais que a verdade

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Atualização:

Depois do café da manhã, dentes escovados e tals eu contei que a gente ia se arrumar para sair de casa com esse objetivo. Ele chorou. Na verdade, ele se desesperou. Disse que odiava "doência" - nome que ele usa em vez de injeção e que eu nunca corrijo porque acho fofo (podem me julgar, mãe tá super acostumada). Correu para o colo do pai, soluçando. Enquanto Sérgio o acalmava eu tentava explicar, em vão, que a vacina doía um pouco sim, mas só na hora. E que a dor valia a pena porque a vacina coloca vários soldadinhos no sangue da gente para lutar contra o temido vilão - o vírus da gripe. Nem com essa explicação meio "Alien - O oitavo passageiro" ele se acalmou. Pelo contrário, começou a chorar com os lábios tremendo de medo. Meu marido fez aquela cara de "para com isso". Parei, pensei e decidi que não ia contar uma história da carochinha para ele ou falar que "tudo bem, você não vai tomar a vacina", colocar no carro para ele descobrir 15 minutos depois que a mamãe tinha mentido. Isso não estava nos planos.Pedi para que se acalmasse, peguei a carteirinha de vacinação e mostrei o quanto ele já tinha sido corajoso nessa vida. Cada carimbo naqueles quadradinhos brancos era sinal disso. "Acho que não sou mais corajoso, mamãe", disse com os olhos cheios de lágrimas.

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Ele veio pro meu colo, chorou, chorou e chorou. Saímos de casa e o destino era então conhecido por ele. Ao chegar à clínica duas outras crianças com cara de poucos amigos. Chegou a vez do Samuca e a enfermeira disse que ia ser como uma picada de formiguinha. Ele baixou a cuequinha, deitou no meu colo e aguentou a injeção chorando baixinho. Levantou magoado. A enfermeira correu e o presenteou com um pirulito. As crianças da sala de espera olharam imediatamente para ele quando a porta se abriu, naquela tentativa de ver o rosto do coitado do menino que deu azar e entrou antes naquela sala dos horrores. Mas viram uma criança calma, pirulito na boca com cara de "não é que minha mãe tinha razão?" Ele jogou o plástico do pirulito no lixo, parou e pensou como quem sente algo que nunca sentiu antes e falou: "Mamãe, é verdade! Os soldadinhos estão subindo pelo meu corpo para lutar contra o vírus. Eles passaram pelo bumbum e estão agora aqui no meu joelho!", apontou, feliz com a descoberta.

 

 

Opinião por Rita Lisauskas

Jornalista, apresentadora e escritora. Autora do livro 'Mãe sem Manual'

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