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Retratos e relatos do cotidiano

Sobre sentir-se pequeno

A gente faz tão pouco

Por Ruth Manus
Atualização:

Este texto chega atrasado. Chega na quinta-feira, quando deveria chegar na quarta. Mas há uma desculpa nobre para esse lapso. Ontem eu tive a sorte de ficar dentro da Sala São Paulo desde as 11 da manhã até as 9 da noite para participar do TEDx São Paulo. Para os que não sabem, o TED é uma organização sem fins lucrativos que promove palestrasde até 18 minutos, com ideias que mereçam ser espalhadas. O TED surgiu há mais de 30 anos na Califórnia e a ideia deu tão certo que surgiu o TEDx, como forma de aumentar o alcance da iniciativa, levando-a para diversos países através de eventos TED organizados de forma independente. Ninguém ganha para falar no TED e os trabalhadores são quase todos voluntários.

 

Eu ainda não sei verbalizar o que senti durante aquelas horas. Peço licença para tentar dividir um pouco deste dia com vocês.

 

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O evento contou com 3 eventos musicais lindíssimos e extremamente simbólicos (conheçam com urgência Nina Oliveira, Trio Gloss e Titanium in concert).

Contou também com Sandra Chemin nos ensinando a moldar o trabalho à nossa vida e não a nossa vida ao trabalho.

Com Mafoane Odara ressaltando o papel da paternidade ativa e da desconstrução de formatos machistas para famílias cada vez mais saudáveis, felizes e justas.

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Com Alice Rossi contando quantas pessoas cegas já foram capacitadas para o trabalho de massoterapeutas através da Serenidade do Toque, ganhando mais liberdade e uma vida mais digna.

Com Preta Rara trazendo um incômodo lindo e necessário ao expor a situação das trabalhadoras domésticas no Brasil, por meio do projeto Eu, empregada doméstica.

Com Mariana Battaglia emocionando com a generosidade da música levada aos hospitais pelo Grupo Saracura e mostrando que a música também é uma forma de cura.

Com Sergio Barbosa trazendo o transformador Tempo de Despertar, projeto de responsabilidade com homens autores de violência contra a mulher, mostrando que transformar pessoas é o melhor caminho.

Com Raquel Preto expondo de forma lógica e irrefutável que as cotas para mulheres em empresas, sobretudo nos órgão de cúpula, são indispensáveis para um país justo e empresas com mais sucesso.

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Com Thais Pegoraro mostrando que o fracasso é um professor melhor do que o sucesso. E que foi através do fracasso que ela se tornou uma das maiores montanhistas do Brasil e do mundo.

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Com Adriana Foz, a pedagoga que teve um AVC e acordou sem saber ler, escrever, falar e andar. Nos ensinou a reaprender a viver e a nos tornarmos amigos dos nossos cérebros.

Por fim, Renata Quintella mostrando que é possível transformar o mundo quando transformamos pessoas através da simples pergunta "o que eu posso fazer por você agora?"

E sim, eu também falei, e foi uma experiência absolutamente maravilhosa. Falei, basicamente, sobre a importância da união dos grupos vulneráveis- mulheres, negros, gays, pessoas com deficiência e tantos outros- para desconstruir a ideia de que nós já nascemos devedores da vida.

 

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Mas eu quero falar sobre os bastidores.

 

Quero falar sobre 11 mulheres e um homem que mal se conheciam. Quero falar sobre uma situação que tinha tudo para provocar sentimentos competitivos e de comparação de performances. Mas que foi o oposto. Cheguei no ensaio geral, na véspera, sozinha. Saí ontem da sala São Paulo mais abraçada do que nunca.

 

Percebi que a minha fala, sobre união- especialmente entre mulheres- consolidou-se naquelas 48 horas. Desconhecidas que poderiam ver-se como rivais tornaram-se apoios, parceiras, torcedoras, aplausos e abraços cúmplices.

 

Os 150 voluntários que trabalharam no feriado por acreditarem no poder de mudar a mente das pessoas, nos acolheram como irmãos. Em qualquer canto havia alguém para nos dar a mão para acalmar nosso nervosismo perante o desafio insano de falar sozinha no palco para 1.500 pessoas sobre uma ideia nossa.

 

Eu ainda não sei verbalizar o que estou sentindo. Mas sei de uma coisa: o meu sonho de união ontem era realidade. E talvez isso queira dizer que sonhos verbalizados começam a virar atos. E os atos de cada uma das pessoas que estava naquele palco eram pequenas inaugurações de um mundo melhor.

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Ontem eu saí de lá acreditando. Passaram-se quase 16 horas e eu continuo acreditando. Acreditando que o mundo tem jeito, que as pessoas são incríveis, que mulheres definitivamente não são inimigas e que coisas boas nunca devem morar só no mundo das ideias. Hoje eu me sinto pequena perto de tudo o que essa gente faz. E sentir-me pequena nunca foi tão bom assim.

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