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Retratos e relatos do cotidiano

Por que ninguém nos ensina a amar São Paulo?

Tem alguma coisa errada aí.

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Por Ruth Manus
Atualização:

Sou paulista. Sou paulista e paulistana, filha de dois paulistanos, nascida na Avenida Paulista.Aprendi, desde criança, a amar o Rio. Me apresentaram os encantos do nordeste, a riqueza do norte, a praticidade de Brasília. Conheci o sul, passei quase todas as minhas férias em Minas, passeei pelas praias do Espírito Santo. Me cobro por ainda não conhecer todas as capitais do meu país. Depois de adulta, desbravei a América Latina e a Europa.  A Ásia e a África estão nos planos. Nova York também não pode esperar muito.

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Todo paulistano é ensinado a gostar do mundo. E temos facilidade para gostar do mundo, provavelmente porque viver em São Paulo é exatamente a arte de ser cidadão do mundo. Mas ninguém gasta muito tempo nos ensinando a amar São Paulo e talvez essa seja uma das maiores injustiças que fazem conosco.

Crescemos ouvindo que São Paulo é grande demais, congestionada demais, perigosa e cruel.  Se eu não conhecesse São Paulo eu a imaginaria como um dragão imenso, tomado pela fúria, cuspindo fogo, esmagando pessoas. Mas, para minha sorte, eu nasci e cresci em São Paulo e sei que minha cidade não é nada disso.

Esqueça o dragão. São Paulo é imensa e tem muitos defeitos, mas São Paulo tem uma qualidade impagável, que eu não vi igual em nenhum outro lugar do mundo: São Paulo é a terra que não julga sua cara, sua história, seu estado civil, nem sua orientação sexual. São Paulo não quer fazer com que você sinta que não cabe aqui. São Paulo deixa todo mundo caber nela. Deixa todo mundo sentir que aquela cidade também é sua.

Dizer que uma cidade te acolhe "de braços abertos" pode não combinar muito bem com São Paulo. Tem mais cara de "sorria, você está na Bahia", eu sei. Mas se entendermos que "braços abertos" significa te dar espaço para ser quem você é, te dar oportunidades de trabalho, boa comida, boa bebida e boa festa, aí não tem para ninguém, amigo. É São Paulo.

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E viver em São Paulo não é para qualquer um. Porque viver em São Paulo exige esforço. É preciso saber lidar com as adversidades. Sim, pagamos um preço alto. O custo de vida não é barato, o trânsito por vezes nos tira do sério e alguns lugares da cidade podem ser inseguros. Disso, todo mundo fala, todo mundo sabe.

Mas não entendo essa necessidade de exaltar os problemas ao invés de falar das maravilhas que São Paulo oferece.

Em São Paulo você pode ser quem você quiser. Pode ser executivo engravatado, pode ser drag queen, pode ser passista de escola de samba, pode ser lutador de muay thai, pode ter a cara tatuada, pode usar camiseta da igreja. Ninguém te estranha, ninguém se choca. Na verdade, no dia a dia paulistano, ninguém nem tem tempo para encher o saco alheio. E isso é bem bom.

Em São Paulo você pode ser anônimo. Pode encontrar mil conhecidos, se quiser, ou não encontrar nenhum se quiser sossego. São Paulo tem esconderijos, tem lugares para ver e ser visto e tem verdadeiros oásis em meio à selva de pedra. São Paulo sempre te dá opções.

Em São Paulo você pode escolher o que deseja comer às 3 da manhã de uma terça-feira. Temaki? Tem. Hamburger? Tem. Salada? Tem. Dogão, churrasco, yakissoba? Tem, tem, tem. O conceito de "vamos ver o que está aberto" não combina com São Paulo.

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São Paulo oferece lazer para todo mundo, a toda hora. Música para todos os gostos, compras para todos os gastos. Uma vida noturna impecável. Aliás, não há cidade melhor no mundo para ser solteiro. E para quem quer deixar de ser solteiro também. São Paulo é onde você conhece gente, onde se apaixona, onde quebra a cara, onde muda o cabelo e vai divar na noite para se refazer. E se refaz. E conhece mais gente. E vive. São Paulo, acima de tudo, faz com que a gente se sinta vivo.

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São Paulo é boa para ser solteiro nos bares. Para piriguetar na balada. Para namorar nos cinemas. São Paulo é boa para casar. Para divorciar também. São Paulo tem parques e teatros infinitos para levar os filhos. Tem lugares para os cachorros correrem. E para os donos também. São Paulo é amiga de todo mundo.

Em São Paulo, num domingo, você pode sair de bicicleta, parar no parque, tomar uma água de côco, ver uma galera lutando capoeira, passar no shopping, comprar uma camiseta fosforescente, seguir para a parada gay, dançar debaixo do sol, dar uma passadinha no MASP, ver Velázquez, Renoir e Botticelli, pegar o metrô, seguir para a Vila Madalena, tomar cerveja bem gelada numa roda de samba, caminhar até um cinema de rua, ver um bom filme e coroar a noite com uma pizza fantástica. São Paulo não é pouca coisa não.

Está na hora de enxergarmos quão maiores são as qualidades de São Paulo do que seus defeitos. De nos orgulharmos dessa cidade que é uma "miniatura" do que é o mundo. Dessa cidade que não julga quem chega, não ordena que você se adapte a ela e seus costumes. Dessa cidade que é feita pelas pessoas que nela vivem, que aceita cada um de nós dentro da sua diversidade e nos dá, todo dia, inúmeras opções de pequenas felicidades.

Obrigada, minha cidade. Minha, de todos os paulistanos e de todo mundo que se dispõe a amá-la.

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