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Um outro olhar sobre as notícias

Uma nova forma de fazer política?

Mais jovens, Macron e Trudeau formaram equipes com a mesma proporção de homens e mulheres. O que isso significa

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Na semana passada, o primeiro escalão do governo brasileiro ganhou mais um homem, Paulo Rabello de Castro. E perdeu uma de suas três mulheres. Maria Silvia Bastos, presidente do BNDES, decidiu deixar o cargo. Continuam na atual gestão Grace Mendonça, da AGU, e Luislinda Valois, dos Direitos Humanos. Um número muito pequeno, mas ainda assim maior do que no primeiro gabinete anunciado por Temer: 24 homens e nenhuma mulher.

O gabinete masculino de Michel Temer. Dida Sampaio/Estadão Foto: Estadão

É impossível deixar de notar a diferença com os nomeados por Emmanuel Macron, que assumiu a presidência da França este mês. Entre os 18 ministros, exatamente a metade são mulheres.

O gabinete 50/50 de Emmanuel Macron. Foto: Philippe Wojazer/Reuters

 Ou com os escolhidos pelo primeiro-ministro Justin Trudeau, que montou o primeiro ministério com igual número de homens e mulheres na história do Canadá. Além da média menor de idade - a maioria tem menos de 50 anos, há diversidade religiosa e étnica, especialmente importante num país em que os imigrantes têm um papel tão importante.

O gabinete de Trudeau contempla toda a diversidade do Canadá. Foto: Chris Wattie/Reuters

Mas Temer não está sozinho com seu ministério majoritariamente masculino e branco. Dos 24 nomeados por Donald Trump, que assumiu este ano a presidência dos Estados Unidos, só quatro são mulheres.

Alguns dos nomeados por Donald Trump nos Estados Unidos. Foto: Divulgação/Casa Branca

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Macron tem 39 anos. Trudeau, 45. Trump, 70, e Temer, 76 anos. Posições ideológicas à parte, será que podemos esperar mais diversidade nos governos se houver uma renovação na política? Qual seria o efeito de ter mais mulheres nos primeiros escalões?

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Dados do Banco Mundial mostram, por exemplo, que a participação feminina na política melhorou o saneamento básico e a educação em vilarejos na Índia. Enquanto os homens tendem a gastar dinheiro em grandes obras, fáceis de serem superfaturadas, elas decidiram investir em escolas e hospitais. O pagamento de propinas também se mostrou levemente menor (de 2,7% a 3,2%) nas gestões com mais mulheres. Desde 1993, o país tem uma lei que reserva a elas 30% dos cargos em câmaras municipais.

Mas isso quer dizer, então, que as mulheres são menos corruptas que os homens? Não é bem assim. Segundo vários estudos mundiais, a presença feminina até pode reduzir a corrupção na administração pública. Não porque elas sejam mais honestas - pesquisas mostram que elas são tão suscetíveis quanto eles a receber propina. Mas porque os sistemas políticos que permitem a eleição de mulheres são mais democráticos e abertos e, geralmente, mais intolerantes com abuso de poder e corrupção.

"Há cada vez mais evidência de que a corrupção funciona em redes políticas e sociais específicas, às quais as mulheres geralmente não têm acesso, principalmente quando ainda são novas nas posições de poder", diz Helen Clark, ex-primeira-ministra da Nova Zelândia que trabalha com questão de gênero na ONU. É como se houvesse um 'Clube do Bolinha' da corrupção no qual a maioria das Luluzinhas não pudesse ir entrando...

Mas, na América Latina, ter mais mulheres na política não significa, necessariamente, menos roubalheira. Não com o sistema político falho que temos, segundo pesquisa publicada em 2016 por Leslie Schwindt-Bayer, da Rice University. Os corruptos não costumam ser pegos, os eleitores se esquecem dos malfeitos, a Justiça demora demais... Será que a Lava Jato vai mudar esse cenário no Brasil?

O esforço para pôr fim à cleptocracia pode ser acompanhado de iniciativas para aumentar a participação das mulheres na política. E nós já temos até lei para isso - embora ela não funcione bem. Desde a eleição de 2010, os partidos são obrigados a registrar ao menos 30% candidaturas de mulheres. Mas isso não tem ajudado a aumentar a participação delas na política: continuam tendo só 11% dos cargos parlamentares - o que nos dá a vergonhosa posição 120 num ranking com 144 países.

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Na eleição de 2016, um levantamento do Tribunal Superior Eleitoral descobriu 16.131 candidaturas sem nenhum voto - nem o do próprio candidato. Entre eles, 14,5 mil eram mulheres, candidatas-laranja recrutadas pelos partidos só para preencher a cota e que nem se preocuparam em disfarçar um mínimo de interesse em serem eleitas.

Com candidatas-laranja e depois do impeachment de Dilma Rousseff, a primeira mulher a chegar à Presidência do Brasil, é tarefa inglória falar de participação feminina na política. Mas todos os fatos desde a eclosão da Lava Jato até a delação de Joesley Batista mostram que, na verdade, é preciso mudar o modo de fazer política. Talvez um bom começo seja eleger pessoas que olham para o Brasil de um novo jeito, e não como um "pedacinho do meu esquema".

Leia na íntegra o estudo sobre participação da mulher na política da América Latina.

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