A 15ª edição do FAAP Moda promete muitas novidades. Ainda em fase de inscrição dos trabalhos, o concurso já tem data certa para ocorrer: 6 de novembro. Até lá, muita coisa vai acontecer, como a seleção das seis coleções finalistas, o desenvolvimento das peças e a escolha dos jurados da grande final. "O júri será composto por 15 estilistas", adianta Renata Paternostro, coordenadora do projeto ao lado de Marianna Dal Canton.
As coleções que irão para a final serão conhecidas apenas na última semana de maio, selecionadas com base no conceito de criação, na possibilidade de execução da peça e na escolha dos tecidos e materiais para confecção. O corpo de jurados nesta primeira fase será composto por três professores da FAAP - Cristiane Rose Candido, Lorenzo Merlino e Fernanda Binotti -, pelo stylist Maurício Ianês e por dois estilistas que ainda estão sendo convidados.
A temática desta edição será "O que a moda fará para o futuro". De acordo com o professor Ivan Bismara, coordenador do curso de Moda, a ideia é que os alunos pensem no futuro e nas transformações que a moda pode fazer.
Lançamento
No evento de lançamento do concurso, realizado no último dia 26 de março, os estilistas Fabio Souza e Alexandre Herchcovith falaram sobre a marca À La Garçonne, que nasceu em 2009 tendo como principal foco o reuso de materiais. Processo criativo e a sustentabilidade na moda também foram abordados na entrevista, feita pelo stylist Mauricio Ianês. Confira um resumo do bate-papo:
A marca À La Garconne garimpa peças antigas e dá uma cara mais contemporânea para essas roupas. Como se dá esse processo de garimpagem e o desenvolvimento das coleções?
Alexandre Herchcovith: Dividimos a confecção em algumas modalidades: uma parte é feita do zero, como qualquer outra confecção, onde buscamos nos fornecedores de tecidos ou aviamentos o que está em estoque há mais tempo. A ideia é dar um novo sentido a algo que está há muito tempo parado no estoque das empresas. Tem as peças garimpadas nos brechós, onde elegemos o que vamos reformar, de acordo com a coleção que gostaríamos de criar. Isso dá um caráter de exclusividade à peça, porque nenhuma é igual à outra, pois o desgaste do tecido depende da maneira como a pessoa fez uso da peça. Existem ainda as coleções feitas em colaboração com as empresas. Damos um novo significado para peças que estão esgotadas, com a a "cara" da empresa e da À La Garçonne.
Pode acontecer ao contrário? Vocês encontrarem peças nesses brechós e modificarcada coleção a partir das roupas encontradas?
Fabio Souza: Muitas vezes, principalmente quando a gente está falando de roupa vintage. A coleção nasce a partir do que é encontrado. À La Garçonne surge dos brechós e das vintage stores, de quando eu garimpava peças antigas esem utilização alguma. Já aconteceu de eu ir buscar uma jaqueta "X" e encontrava uma parca "Y". Então, muitas vezes eu mudo toda a coleção em função disso.
Muita gente talvez não veja esse ato de garimpagem como algo criativo. O ato da escolha da peça vintage que vai entrar também pode ser uma ação criativa e a interferência que se vai fazer depois?
Alexandre Herchcovith: O fato de você pegar uma peça vintage e pensar nela, mesmo que você decida que a modificação não vai ser tão grande, também é um ato de criação e edição. A gente faz uma seleção e isso também é um olhar. Não é pegar qualquer coisa. Há sempre um mínimo de customização que a gente faz numa peça. Mesmo que a gente dê uma reformada na peça, a gente já considerada uma peça À La Garçonne. No entanto, tem peças que são totalmente descaracterizadas. Há duas coleções que trabalhamos de trench coat, da Burberry, que nós desmontamos e, dos tecidos, fizemos roupas. Com o forro fizemos outra peça e os botões utilizamos em outra coisa. Esse é o nível máximo de modificação e se gasta muito tempo nessas modificações. Existem níveis de interferência.
Fabio Souza: Existem peças que criamos, que precisamos de três ou quatro peças diferentes para montá-la. Desmanchamos todas e com os retalhos a gente faz uma peça nova. No último desfile, por exemplo, a gente fez um vestido e uma saia de uma cortina antiga.
À La Garçonne tem móveis e decoração. Existe um diálogo entre a coleção de moda e o mobiliário?
Fabio Souza:São negócios separados. Dificilmente a gente conseguiria relacionar. A gente às vezes monta uma coleção na loja com um mobiliário próximo, mas não como uma coleção só.
Alexandre Herchcovith: Mas tem uma coisa que une os dois negócios que é o reuso. Existe uma garimpagem, um olhar naquilo que o Fabio acha que pode vender. O conceito é aplicado da mesma maneira, mas nos móveis há poucas modificações. Eles são apenas restaurados.
Upcycling , que é dar novas formas de reuso ao material, e areciclagem estão ligados à moda sustentável. Vocês se veem com essa ideia de marca sustentável?
Alexandre Herchcovith: Nós temos a liberdade de não ficarmos presos a estereótipos. Então, quando a gente faz roupa do zero, entramos em um processo normal de matéria-prima e confecção. Essa peça específica tem uma carga de sustentabilidade leve. A gente usa tecidos com fibras 100% recicláveis, mas quando não conseguimos o que queremos compramos do estoque. Nunca mandamos fabricar. Com isso, a gente imagina que está contribuindo para essa cadeia toda. Na À La Garçonne temos pouco estoque também para não gerar sobras.
Fabio Souza: Algumas peças são quase impossíveis de conseguir na indústria, como os aviamentos. Mesmo que a gente quisesse seria muito difícil porque a indústria não oferece. É possível conseguir algodão, poliéster e linho. Mas não há seda, por exemplo. Mas já há alguns estudos sobre a seda. Então, a gente reforça o uso de peças antigas ou de materiais do estoque, que estavam ali parados e poderiam virar lixo.
Também, quando a gente se associa a uma grande empresa, por exemplo, a gente tenta sempre saber como eles vão se livrar do lixo, das sobras. Tentamos saber se o produto é reciclável ou não etc. É uma preocupação constante.
Alexandre Herchcovith: Na nossa marca não existe o conceito de coleção que segue o clima. A gente faz uma coleção atemporal, que fica pelo menos um ano vendendo na loja. Essa coleção não é esquecida e depois entra uma coleção nova que desmerece o que o cliente comprou há seis meses. Estamos mudando aos poucos esse conceito de sazonalidade.
Além de existir um movimento de reduzir a quantidade de peças produzidas, existe ainda a preocupação com o funcionário. Quanto maior a indústria, menos contato com os colaboradores. Como vocês veem a relação de desenvolvimento da coleção com as pessoas que produzem as roupas de fato?
Fabio Souza: Construímos uma relação de proximidade com todos os funcionários e queremos sempre o bem-estar de todos. Muitas vezes o acabamento se dá na máquina de costura com a piloteira e o resultado final é muito melhor.
Alexandre Herchcovith: Nós ouvimos muito. Todo mundo pode dar ideia. Nem sempre é a minha ou a do Fabio. Quando a gente conversa com o modelista, ele se sente aberto a fazer algum tipo de interferência. Da mesma forma com a costureira, a piloteira e a produção. Existe sempre uma abertura muito grande de ouvir e aproveitar a expertise de cada um.