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Impressões sobre a vida e seus arredores

Um poeta na barraquinha

Versos entre um pastel e um caldo de cana

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Por Raul Drewnick
Atualização:

Comer um pastel e tomar um caldo de cana é coisa comum. Mas, se à cena se acrescenta um poeta, já é diferente. Era o que pensava Marcita, olhando encantada para o rapaz que tinha acabado de puxar uma cadeira para a mesinha e, pedindo licença, havia estendido um cartão: Paulo Ramires, poeta. Talvez mesmo sem o cartão ela soubesse, ao primeiro olhar, que ele era poeta. Exatamente como ela sempre imaginara um: cabelos longos, rosto pálido, olhos claros, voz grave. Ela agradeceu, enfiou o cartão na bolsa e, sem saber o que fazer em seguida, deu uma mordida no pastel, bebeu um gole do caldo de cana e, já quase em pânico, tentou imaginar o que as pessoas poderiam dizer a um poeta. Pensou em perguntar o que ele fazia. Foi o que fez. Perguntou. Poesia, ele respondeu. Ah, ela disse, receando que ele começasse a zombar da estupidez dela, mas ele só sorriu e tirou de uma pasta de elástico um catálogo. Olhe o que eu faço, ele convidou, pondo-se a virar lentamente as páginas. Este é um poema de Natal, este aqui é para o Dia das Mães, este para um aniversário. Todos fui eu que escrevi, pode ficar tranquila. Você não vai achar em livro, na internet, em lugar nenhum. E eu faço personalizado também, sabe como é? Se o seu namorado se chamar Lucas, ou Marcos, eu faço uma poesia tendo como tema o nome dele. É um acróstico. E é baratinho, sabe? Faço mais por amor à arte. Cada poema vinha com pelo menos uma ilustração (também feita por ele) e, pela beleza delas, ela sentiu que ele era um bom poeta. E teve mais certeza ainda quando perguntou se ele queria acompanhá-la no lanche, ao ver como ele olhava para o pastel e para o caldo de cana. Ele disse que ela devia ter o dom de adivinhar, porque ele esquecera em casa o cartão e o dinheiro, e estava com fome e sede. Aceitaria, com uma condição. Pagaria com um poema dedicado a ela. Como ela se chamava? Marcita? Ah, ia ser fácil, dava para usar rimas muito boas. Bonita, por exemplo, ele disse, pegando um bloquinho e uma caneta, enquanto ela pedia um pastel e um caldo de cana ao rapaz da barraquinha.

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