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Impressões sobre a vida e seus arredores

A garota

Mala na mão, ela toca a campainha

Por Raul Drewnick
Atualização:

pixabay Foto: Estadão

Ela apareceu numa tarde de domingo. O homem, ao ouvir a campainha, olhou pela fresta da cortina e pensou quem poderia ser aquela garota cujo rosto, porém, lhe parecia familiar. Estava pedindo ajuda à memória quando reparou na mala dela. Que estranho, aquilo. Então se lembrou. Não, não era possível. Mas era. Que maluca! A melhor solução seria não atender.

A garota tocou novamente. Ele sentiu vontade de estar morto. Ah, que bom seria. Morto, bem mortinho. Quando a campainha soou pela terceira vez, ele, em pânico, abriu a porta e andou até o portão. Era um dia de inverno, mas ele estava suando.

A garota sorriu e segurou a mala como se fosse um troféu de campeã.

"Oi", ela cumprimentou, "eu resolvi vir."

"É, estou vendo."

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Depois  dessa frase estúpida, ele fez uma pergunta tola:

"Você  veio me visitar?"

"Eu vim morar com você. Você disse que eu podia vir, lembra?"

O homem pensou de novo como seria bom estar morto. Precisava dizer alguma coisa, e o que disse foi:

"Mas isso foi no ano passado."

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"Foi. Mas, como você nunca mais mandou mensagem, eu achei que estava tudo certo. Está, não é?"

"Você também não mandou mais nenhuma mensagem.  Olhe, a coisa não...", ele começou a dizer, e nesse momento surgiu atrás dele uma mulher de olhos sonolentos:

"O que é, amor?"

Ele olhou para ela, para a garota, suspirou e viu que só lhe restava apresentar uma à outra. Era o que lhe cabia, já que continuava inconvenientemente vivo. Apontou a garota:

"Amor, esta é a Lara, uma amiga."

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Depois, apontando a mulher, disse:

"Lara, esta é a Vilma, minha mu..."

Antes que ele acabasse a frase, a garota ergueu um pouco mais a mala e, estendendo a outra mão, sorriu:

"Prazer."

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