PUBLICIDADE

EXCLUSIVO PARA ASSINANTES
Foto do(a) coluna

Psiquiatria e sociedade

Opinião|Estupradores de trem

Foto do author Daniel Martins de Barros
Atualização:

A prisão de um homem por estupro na Estação de trem da Luz, em São Paulo, eleva a um novo patamar de bizarrice tanto a situação decrépita do transporte público no país como a patética condição humana nesses tempos de redes sociais.

PUBLICIDADE

O sujeito confessou ter atacado uma mulher durante o tumulto que se faz na plataforma nos horários de pico. Segundo o delegado ele chegou às vias de fato, tendo ejaculado nas roupas da vítima. Descoberto pelos outros usuários da estação, foi espancado até que seguranças intervieram, tarde demais para evitar a luxação do braço da mulher que havia sido por ele agarrada.

Infelizmente não é a primeira vez - e nem será a última - que uma mulher é vítima dessa violência. A primeira descrição desse comportamento data do século XIX, quando foi chamada de frotteurismo (do francês, frotter - esfregar) pelo psiquiatra Krafft-Ebing. Já na época se sabia tratar-se claramente de um comportamento ligado ao gênero, com a maioria absoluta dos casos sendo de homens abusando de mulheres (embora outras formas possam ocorrer), normalmente em lugares públicos, sem consentimento da vítima. A novidade é que isso ganhou um novo estímulo em grupos de discussão na internet que - acredite - promovem esse tipo de atitude. Embora os autodenominados "encoxadores" digam que só se aproximam de forma consensual, esse "consentimento" é obtido de forma indireta, por "olhares de aprovação" e "sorrisos discretos". Pouco provável que haja consenso. E o homem preso disse que foi estimulado por essas discussões, não se aguentando quando o trem ficou muito apertado.

É óbvio que não se pode crer que páginas na internet sejam causa necessária e suficiente para levar alguém a cometer um crime como esse. Mas ao mesmo tempo é inegável que encontrar grupos que compartilhem desse comportamento confere ao criminoso uma sensação de chancela social para sua perversão, facilitando sua ocorrência. Da mesma forma a superlotação do transporte público não é a origem do problema, mas não deixa de ser um fator de risco para esse crime.

Sem atuar sobre esses dois fatores, tais ocorrências - quinze apenas esse ano - deverão manter a tendência de crescimento. Como disse Jô Soares, "Prendam logo a ocasião, antes que ela faça outro ladrão".

Publicidade

Opinião por Daniel Martins de Barros

Professor colaborador do Dep. de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP. Autor do livro 'Rir é Preciso'

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.